quinta-feira, 29 de dezembro de 2016

O Jus Variandi como exceção ao Princípio da Inalterabilidade

O princípio do jus variandi consiste no direito que possui o empregador de alterar unilateralmente, em casos excepcionais, as condições de trabalho dos seus empregados. Em decorrência do poder de direção do empregador a lei autoriza pequenas modificações unilaterais no contrato de trabalho que não venham a mudar significativamente o pacto laboral.
Representa o jus variandi um abrandamento do princípio geral da imodificabilidade das condições de trabalho. O jus variandi possibilita alterações excepcionais referentes à função, ao salário e ao local da prestação dos serviços. Alterações rotineiras, como mudança de horário, modificação da seção ou do departamento em que  o empregado presta seus serviços, etc., são justificados por esse princípio.
O empregador poderá alterar, excepcionalmente, a função do empregado. É o que ocorre, por exemplo, quando o empregador dispensa o empregado da função de confiança que exercia e determina seu retorno à função anterior. Nesse caso, a CLTA autoriza expressamente a movimentação do empregado dispondo que "não se considera alteração unilateral a determinação do empregador para que o respectivo empregado reverta ao cargo efetivo, anteriormente ocupado, deixando o exercício da função de confiança" (art. 468)
Uma outra hipótese de aplicação do jus variandi encontra-se plasmada no art. 450 da CLT, segundo o qual "ao empregado chamado a ocupar, em comissão, interinamente, ou em substituição eventual ou temporária, cargo diverso do que exercer na empresa, serão garantidas a contagem do tempo naquele serviço, bem como a volta ao cargo anterior".
Ainda, a CLT, em seu art. 461, § 4º, trata de mais uma situação que pode ocorrer alteração de função do trabalhador. É o caso do empregado readaptado em razão de deficiência física ou mental atestada pelo INSS, que passa a exercer uma nova função compatível com a limitação por ele sofrida em suas habilidades.
A doutrina, arrimada no princípio do jus variandi, admite a alteração de função do empregado em outras hipóteses, desde que presentes razões justificadoras para tal atitude. Pode acontecer, por exemplo, a necessidade de extinção de cargos em certos estabelecimentos da empresa, hipótese em que, ela, a fim de evitar a dispensa dos empregados, pode aloca-los em outras atividades compatíveis com as anteriormente exercidas.
Essas alterações de função, no entanto, devem ser efetuadas dentro de critérios de razoabilidade, não podendo implicar significativa modificação das qualificações do trabalho desenvolvido. Caso contrário, serão tidas por ilegítimas, ficando assegurado ao empregado o direito de considerar rescindido o contrato de trabalho e pleitear a indenização a ele devida como se houvesse sido dispensado sem justa causa. Configura-se, nessa situação, a justa causa do empregador (contra o empregador), pressuposto da chamada dispensa indireta (CLT, art. 483, "d"). É a aplicação do princípio do ius resistentiae, que assegura ao empregado o direito de resistir às alterações injustas, ou a ele prejudiciais, impostas pelo empregador.
Em relação ao salário, o jus variandi justifica algumas alterações de seu valor pelo empregador, desde que presentes razões inequivocamente justificadoras, especialmente relacionadas com aspectos técnicos da prestação de serviços. Se o empregado recebe o salário por unidade produzida, laborando com uma máquina obsoleta, de baixa produtividade, e esta vem a ser substituída pelo empregador por uma moderna, com capacidade de produção horária muito superior à da antiga, o empresário poderá mudar o salário do empregado, ajustando-o à nova realidade de produção. Caso contrário, o empregado passaria a receber um salário desmesurado, se comparado aos salários vigentes no mercado, percebidos por trabalhadores com nível de qualificação equivalente ao seu, fato que terminaria por acarretar sua demissão pelo empregador e a contratação de um outro empregado remunerado sob novos parâmetros.
A CLT permitia outra hipótese de alteração unilateral de salário, em casos de força maior ou prejuízos devidamente comprovados (art. 503). Esse dispositivo, contudo, foi derrogado pela Constituição Federal, que somente permite a redução salarial mediante acordo ou convenção coletiva, (art. 7º, VI). É bem verdade que a previsão constitucional não reclama motivação para a redução. Significa dizer que nada impede que diante de um caso de força maior haja redução do salário. Entretanto,  essa alteração não está mais no poder do empregador, uma vez que a Constituição estabelece a negociação coletiva como condição imprescindível para a redução.
 
O empregador pode, ainda, com base no princípio do jus variandi, alterar o local de trabalho do empregado, decidindo unilateralmente sua transferência, desde que haja necessidade de serviço (CLT, art. 469, § 3º) ou extinção do estabelecimento em que trabalhe o empregado.
 
(Vicente Paulo - Marcelo Alexandrino - Manual de Direito do Trabalho -  Gen/ Método/Vicente & Marcelo editores)

terça-feira, 27 de dezembro de 2016

Extinção do contrato de trabalho - Extinção da empresa

Uma empresa pode extinguir-se por vários motivos: força maior, ato do governo (ex.: desapropriação), impossibilidade de prosseguimento do negócio etc. Pode, também, ocorrer simplesmente a extinção de um dos seus estabelecimentos ou filiais. Ou, menos ainda, de uma das seções.
Havendo extinção total da empresa, fechamento de quaisquer de seus estabelecimentos, filiais ou agências, supressão de parte de suas atividades, a Lei n. 8.036, de 1990, art. 20,II, autoriza o saaque do Fundo de Garantia pelo empregado.

(Amauri Mascaro Nascimento - Iniciação ao Direito do Trabalho - LTR)

Extinção do contrato de trabalho - Morte do Empregador

A morte do empregador pessoa física por si não interfere na extinção do contrato se o negócio prosseguir com outros titulares. Interfere se houver extinção da empresa.
Nesse caso, a Lei n. 8.036, de 1990, art. 20, II, autoriza o empregado a sacar os depósitos do Fundo de Garantia, sempre que a morte do empregador individual implique rescisão do contrato de trabalho, comprovada por declaração escrita da empresa, suprida, quando for o caso, por decisão judicial transitada em julgado. A CLT, art. 483, §2º, dispõe que, "no caso de morte do empregador constituído em empresa individual, é facultado ao empregado rescindir o contrato de trabalho."

(Amauri Mascaro Nascimento - Iniciação ao Direito do Trabalho - LTR)

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO POR INICIATIVA DO EMPREGADO - DISPENSA INDIRETA

O conceito de dispensa indireta em nosso direito não é difícil, entendendo-se como tal a rescisão do contrato de trabalho por decisão do empregado, tendo em vista justa causa que o atingiu praticada pelo empregador (CLT, art. 483). Impõe-se a imediata ruptura do vínculo, o que equivale à necessidade de cessar o trabalho por ato do empregado. A CLT não prevê forma para esse ato. Pode traduzir-se em comunicação verbal ou escrita. Pode nem haver comunicação, mas simples afastamento do serviço, com um risco. O empregador não terá ciência oficial do motivo que levou o empregado a deixar de trabalhar. Interpretará suas ausências como quiser, inclusive como abandono de emprego. Portanto, convém que o empregado faça uma comunicação de alguma forma. Terá direito a reparações econômicas. Dificilmente o empregador reconhecerá que praticou contra o empregado justa causa. Assim, é parte complementar  e indispensável da figura do processo judicial para definição dos fatos e decisão da Justiça do Trabalho. O emprego, qualquer  que venha a ser a sentença judicial, estará terminado. Tudo quanto se discutirá no processo serão as reparações econômicas. Julgada improcedente a ação, o empregado não as terá.
Essa via de desvinculação do trabalhador, dispensa indireta, não o obriga a permanecer na empresa durante o período de aviso prévio ao empregador. Afasta-se imediatamente e pronto. Aliás,. se não o fizer, se continuar trabalhando após a justa causa de que se julga vítima, é possível que se descaracterize a justa causa  por falta de imediação. A resposta do empregado à falta que sofreu deve ser imediata, tal como quando o empregador o despede por justa causa. A ruptura do contrato de trabalho deve ser instantânea. A razão, simples de entender, é que ninguém é obrigado a prosseguir com um contrato no qual a outra parte descumpriu um das suas obrigações.
A partir de 1983, com a Lei n. 7.108, foi acrescentado ao art. 487 da CLT o §4º dispondo que "é devido o aviso prévio na despedida indireta."
Dispõe o art. 483 da CLT  que o empregado poderá considerar rescindido o seu contrato de trabalho e pleitear a devida indenização (CLT, art. 477), em virtude de falta do empregador. Terá, nesse caso, assegurado, inclusive por via judicial,  seu direito ao FGTS, aviso prévio, décimo terceiro salário proporcional |(Lei n. 4.090, art. 3º) e férias proporcionais. Poderá levantar os depósitos do Fundo de Garantia, inclusive com pagamento de acréscimo a ser efetuado pelo empregador.

(Iniciação ao Direito do Trabalho - Amauri Mascaro Nascimento - LTR)

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

EXTINÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO POR DECISÃO DO EMPREGADO - DO PEDIDO DE DEMISSÃO

De três modos pode o empregado dar por rescindido o contrato de trabalho: por pedido de demissão, por dispensa indireta e por aposentadoria. Esta nem sempre é o resultado de sua vontade, embora quase sempre o seja. Há aposentadorias que resultam de circunstâncias alheias à vontade do empregado, como a invalidez, mas em número bem menor, não constituindo a regra geral.

DEMISSÃO. Pedido de demissão é a comunicação do empregado ao empregador de que não pretende mais dar continuidade ao contrato de trabalho. Não tem forma prevista em lei, mas segundo a praxe é escrita.. Tem de ser feita com certa antecedência (CLT, art. 487), constituindo, portanto, em aviso prévio, que uma vez não cumprido pode prejudicar o empregado. A falta de aviso prévio do empregado que pede demissão autoriza o empregador a reter o saldo de salários, se o tiver (CLT, art. 487, § 1º). O empregado tem o dever de aguardar  em serviço o decurso do prazo do aviso prévio, a menos que o empregador concorde em liberá-lo.
Quando o empregado permanece no emprego durante o período de aviso prévio podem surgir problemas jurídicos decorrentes de fatos supervenientes e que complicam o desfecho. É o caso do abandono do restante do prazo, às vezes até por um fato inafastável, como a obtenção de um novo emprego a ser imediatamente assumido. De acordo com a STST n. 73, "a ocorrência de justa causa, salvo a de abandono de emprego, no decurso do prazo do aviso prévio dado pelo empregador, retira do empregado qualquer direito às verbas rescisórias de natureza indenizatória". Interprete-se essa jurisprudência como favorável ao empregado. Preserva as reparações econômicas a que tem direito, ainda que abandone o emprego no decurso do aviso prévio. Porém, se o empregado incorre em justa causa e o empregador o despede, o fato de ter sido praticada a falta no curso do aviso prévio resultante de pedido de demissão - ou mesmo de dispensa imotivada - prejudicará as reparações econômicas. A regra, portanto, pode ser expressada da seguinte maneira: justa causa no curso do aviso prévio centraliza a caracterização do modo de extinção do contrato de trabalho autorizando a dispensa com justa causa, uma vez que o período de aviso prévio tem natureza de tempo que se integra para todos os efeitos no contrato de trabalho. A causa originária que foi o motivo inicial que levou o empregado a desligar-se, o pedido de demissão, é absorvida pela dispensa com justa causa.
Outra questão jurídica que tem surgido é referente à eficácia do pedido de dispensa do cumprimento do aviso prévio pelo empregado. Quando é possível certificar-se de que ocorreu de manifestação livre da vontade, nada se poderá objetar, o ato é válido e o contrato terminará no último dia de trabalho, sem a contagem do aviso prévio, tratando-se aqui de uma renúncia no benefício do próprio trabalhador. Ele pode ter interesse inclusive de começar a trabalhar em novo emprego. Todavia, agrava-se a questão quando há suspeitas de vício da vontade. O empregado é levado a assinar documento sem que na realidade tenha manifestado essa pretensão de renunciar ao direito de cumprir no serviço o período de aviso prévio. Nesse caso é aplicável o disposto no art. 9º da CLT, que considera nulo todo ato destinado a desvirtuar, impedir ou fraudar seus dispositivos.
Ao demissionário é indevida indenização (CLT, art. 477). Terá direito ao décimo terceiro proporcional aos meses do ano (Lei nº 4.090, de 1962, art. 1º, e STST nº 157. Com menos de doze meses, o demissionário não terá férias proporcionais. Com mais de doze meses, terá direito às férias proporcionais (CLT, arts. 146, parágrafo único, e 147).

(AMAURI MASCARO NASCIMENTO - Iniciação ao Direito do Trabalho - Editora LTr - 36ª edição)




Constitucionalismo Social

O constitucionalismo social é o movimento que teve início em 1917, com a Constituição Mexicana, e que se caracteriza pela inserção dos direitos trabalhistas e sociais fundamentais nos textos das Constituições dos países.
Considerando-se que uma das principais funções do Estado é a promoção da justiça social, nada mais lógico do que a Constituição, como norma fundamental. prever os direitos e garantias básicas que levem à realização deste objetivo. As Constituições passaram a se preocupar também com o homem social, e não mais apenas com o homem político.
A Constituição Mexicana de 1917 foi a primeira a construir uma estrutura significativa de direitos sociais do trabalhador e inspirou muitas Constituições de países da América Latina.
Na mesma esteira de constitucionalização dos direitos sociais, a Alemanha, em 1919, adotou a Constituição de Weimar, que continha um capítulo sobre a ordem econômica e social, previa a participação dos trabalhadores nas empresas e no próprio governo por meio de conselhos específicos, assegurava a liberdade sindical e colocava o trabalhador sob a proteção do Estado.
A Constituição de Weimar, por motivos óbvios, foi rechaçada pelo nazismo, mas, apesar de sua curta vigência, foi, em termos de direitos sociais, modelo para várias Constituições europeias.
Aos poucos, as Constituições modernas dos Estados democráticos foram reproduzindo os princípios das Cartas do México e da Alemanha, principalmente após a Declaração da Filadélfia de 1944, instrumento jurídico aprovado na Conferência da Organização Internacional do Trabalho (OIT) realizada naquele ano, e a a adoção pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1948 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, embora nem todas as Constituições hoje em vigor disponham especificamente sobre direitos sociais do trabalhador.
No âmbito constitucional, a análise do Direito do Trabalho no Brasil deve ser feita em dois períodos, tendo como marco divisor a Revolução de 1930, ou seja, as Constituições Brasileiras anteriores a 1930 (1824 e 1891) e as posteriores a 1930 (1934, 1937, 1946, 1967, com as modificações introduzidas pela Emenda Constitucional n. 1 de 1969, e 1988).
A primeira destas fases é caracterizada pela ausência de proteção aos trabalhadores. As Constituições de 1824 e de 1891 não continham qualquer previsão neste sentido. A Constituição do Império consagrava a filosofia liberal da Revolução Francesa e, portanto,  não poderia impor qualquer intervenção estatal nas relações contratuais de trabalho que, além do mais, eram pouquíssimas, visto que ainda nesta época e até 1888 a mão de obra no Brasil era basicamente escrava. A primeira Carta Republicana foi influenciada pela Constituição norte-americana, estabelecendo um Estado federal, republicano, presidencialista e liberal, o que a impedia de cuidar dos direitos sociais do trabalhador.
A Constituição de 1988 tem um forte conteúdo social, englobando disposições referentes aos direitos e garantias individuais (art. 5º), aos direitos sociais (art. 5º a 11) e, ainda,  às disposições que compõem o Título VIII (Da Ordem Social).

(Direito do Trabalho Esquematizado - Carla Teresa Martins Romar - Coordenador Pedro Lenza - Editora Saraiva)