terça-feira, 24 de novembro de 2009

Quando a Responsabilidade de Reparar Danos é do Estado


Morte e maus tratos em penitenciárias, acidente envolvendo crianças na escola, morte de paciente em hospital público... Muitas são as atribuições do Estado, consequentemente, muitos são os resultados que podem gerar a obrigação de reparar. Essas discussões acabam sendo dirimidas no Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A responsabilidade civil – a obrigação de reparar o dano causado a alguém – não está restrita à pessoa física. Com a formação da sociedade e, consequentemente, do Estado, não raras vezes o próprio ente público passou a ser responsável pelos danos causados. É a responsabilidade civil do estado, o mecanismo de defesa que o indivíduo possui perante o Estado, ou seja, a forma de o cidadão assegurar que todo direito seu que tenha sido lesionado pela ação de qualquer servidor público no exercício de suas atividades seja ressarcido. Pela natureza da causa, é comum que esse tipo de reclamação venha a ser apreciado pelo Tribunal da Cidadania.

O direito a esse ressarcimento está assegurado na própria Constituição Federal. O artigo 37, que vincula a administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios à obediência aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, determina literalmente que “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

Omissão também é crime

Não só a ação do agente público é responsabilidade do Estado. Esta também se caracteriza pela falta de agir do ente público. É disso que trata decisão individual do ministro Luiz Fux em um recurso (Ag 1192340) envolvendo pedido de indenização contra o município por danos materiais e morais, em razão de queda de placa de sinalização de trânsito, atingindo o teto de um automóvel. O ministro destacou farta jurisprudência do STJ no sentido de que, em se tratando de conduta omissiva do Estado, a responsabilidade é subjetiva e, neste caso, deve ser discutida a culpa estatal.

“Este entendimento cinge-se no fato de que, na hipótese de responsabilidade subjetiva do Estado, mais especificamente, por omissão do Poder Público, o que depende é a comprovação da inércia na prestação do serviço público, sendo imprescindível a demonstração do mau funcionamento do serviço, para que seja configurada a responsabilidade”, afirma o ministro. Diferente é a situação em que se configura a responsabilidade objetiva do Estado, na qual o dever de indenizar decorre do nexo causal entre o ato administrativo e o prejuízo causado ao particular, que dispensa a apreciação dos elementos subjetivos (dolo e culpa estatal), pois “esses vícios na manifestação da vontade dizem respeito, apenas, ao eventual direito de regresso”, explicou o ministro. A seu ver, tanto na responsabilidade objetiva quanto na subjetiva deve-se ver o nexo de causalidade. Como o tribunal de origem admitiu a ocorrência de omissão do município em não fixar placa de sinalização de forma a suportar intempéries naturais, foi mantido o dever de indenizar.

O Estado e o meio ambiente

O dano ao meio ambiente também pode ser de responsabilidade do Estado, seja pela ação ou por omissão. Em um recurso da União, da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e de outras empresas carboníferas (REsp 647493), a Segunda Turma reconheceu que a responsabilidade do Estado por omissão é subjetiva, melhor explicando, exige a prova da culpa, mesmo sendo relativa ao dano ao meio ambiente, “uma vez que a ilicitude no comportamento omissivo é aferida sob a perspectiva de que deveria o Estado ter agido conforme estabelece a lei”, entendeu o ministro João Otávio de Noronha, que relatou o processo.

A discussão começou em uma ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal contra a União e algumas companhias de extração de carvão, bem como seus sócios. A CSN e o Estado de Santa Catarina passaram a compor o pólo passivo. O objetivo: a recuperação da região sul de Santa Catarina, atingida pela poluição causada pelas empresas mineradoras. O recurso contestava a condenação de todos os envolvidos a implementar, em seis meses, projeto de recuperação da região, com cronograma de execução para três anos, com multa mensal de 1% sobre o valor da causa no caso de atraso; obrigação de ajuste das condutas às normas de proteção ao meio ambiente, no prazo de 60 dias, sob pena de interdição. Concedeu-se a antecipação dos efeitos da tutela, decisão mantida em segundo grau.

Em decisão inédita, o STJ concluiu existir responsabilidade solidária entre o poder público e as empresas poluidoras, ou seja: todos respondem pela reparação. A estimativa inicial do MPF era que o valor da causa alcançasse a cifra de US$ 90 milhões. O relator considerou que a União tem o dever de fiscalizar as atividades de extração mineral, de forma que elas sejam equalizadas à conservação ambiental. O ministro considerou também que a busca por reparação ou recuperação ambiental pode ocorrer a qualquer momento, pois é imprescritível.

Desde 2004, o STJ reconhece a legitimidade do MP para exigir reparação do meio ambiente. Em decisão também da Segunda Turma (REsp 429570), a ministra Eliana Calmon determinou: “Comprovado tecnicamente ser imprescindível, para o meio ambiente, a realização de obras de recuperação do solo, tem o Ministério Público legitimidade para exigi-la”. O caso envolvia uma ação civil pública ajuizada pelo MP de Goiás visando obrigar o Município de Goiânia a promover obras de recuperação da área degradada por erosões nas vilas Maria Dilce e Cristina, que estariam causando danos ao meio ambiente e riscos à população circunvizinha. A Turma deu provimento ao recurso, ordenando à Administração providenciar imediatamente as obras necessárias à recomposição do meio ambiente.

Não apenas indústrias poluindo rios e navios petroleiros vazando óleo no mar são motivo de pedidos de indenização. O mau acondicionamento do lixo pela Prefeitura também implica o dever de reparar. Um recurso (REsp 699287) em cima de uma ação civil pública de improbidade ajuizada pelo MP contra o ex-prefeito acreano chegou ao STJ. A ação discutia o fato de ter sido ordenado que o lixo coletado na cidade fosse depositado em área totalmente inadequada (situada nos fundos de uma escola municipal e de uma fábrica de pescados), de modo que tal ato, por acarretar grandes danos ao meio ambiente e à população das proximidades. Por determinação do STJ, a ação contra o ex-prefeito vai prosseguir.

O Estado e o sistema penitenciário

O Sistema Penitenciário brasileiro é rico em exemplos de dano causado pelo Estado. Mortes em estabelecimentos prisionais, prisão indevida, falta de condições e superlotação são alguns deles.

Em 2007, 14 anos depois da chacina de Vigário Geral, o tribunal garantiu a um policial militar, preso indevidamente por mais de dois anos por suposta participação no crime, indenização do Estado do Rio de Janeiro. O policial foi absolvido por insuficiência de indícios de sua participação no crime sem sequer ser pronunciado em juízo. O Tribunal, seguindo o entendimento do ministro Luiz Fux, reconheceu a responsabilidade objetiva do Estado e restabeleceu a indenização fixada em sentença e posteriormente reformada em segundo grau. O policial recebeu R$ 100 mil – corrigidos monetariamente – a título de danos morais (REsp 872630).

Também foi por prisão indevida o caso considerado o mais grave de responsabilidade civil do Estado pelos ministros do STJ. O tribunal garantiu, em 2006, uma indenização de R$ 2 milhões por danos morais e materiais a um cidadão mantido preso ilegalmente por mais de 13 anos no presídio Aníbal Bruno, em Recife (PE). Para o Tribunal da Cidadania, foi o mais grave atentado e violação aos direitos humanos já visto na sociedade brasileira, um caso de extrema crueldade a que foi submetido um cidadão pelas instituições públicas. “É o caso mais grave que já vi”, assinalou a ministra Denise Arruda: “Mostra simplesmente uma falha generalizada do Poder Executivo, do Ministério Público e do Poder Judiciário. O valor, alto para os padrões do tribunal, foi mantido pelo STJ que considerou a situação “excepcionalíssima”, por ser um dos mais longos sofrimentos que o Estado impôs a um cidadão.

Os pedidos de indenização envolvendo detentos são muitos. O STJ já firmou jurisprudência no sentido de que o dever de proteção do Estado em relação aos detentos abrange, inclusive, protegê-los contra si mesmos e impedir que causem danos uns aos outros. Conforme destaca o ministro Teori Albino Zavascki, da Primeira Turma do STJ, o dever de ressarcir danos, inclusive morais, efetivamente causados por ato dos agentes estatais ou pela sua inadequada prestação de serviços públicos decorre do artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal de 1988, dispositivo autoaplicável. Dessa forma, ocorrendo o dano e estabelecido o nexo causal com a atuação da Administração ou dos seus agentes, nasce a responsabilidade civil do Estado e, nesses casos, o dever de ressarcir.

Nesse sentido, o STJ já garantiu o direito da família à indenização pela morte de detentos tanto custodiados em delegacia quanto em penitenciárias, mesmo em caso de rebelião (Ag 986208), também reconheceu a legitimidade de irmã de detento morto no estabelecimento prisional para propor ação de indenização (REsp 1054443). Além disso, a responsabilidade civil do Estado nos casos de morte de pessoas custodiadas é objetiva, portanto, não é necessário determinar audiência para colheita de prova testemunhal cujo objetivo seria demonstrar a ausência de culpa do Estado (REsp 1022798).

O Estado responsável por nossas crianças

As crianças são particularmente protegidas em nossa legislação. A Constituição e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) demonstram o cuidado que o Estado deve ter com esse público jovem. Quando o Estado falha em sua função, surge a responsabilidade pelo dano.

A queda de uma criança de quatro anos do terceiro andar de uma escola municipal obrigou o município do Rio de Janeiro Estado a indenizar a família pela perda, tanto, materialmente, quanto moralmente, em R$ 80 mil. A menina deixava a sala de aula em fila com os demais alunos no momento do acidente e não resistiu à queda. O STJ garantiu que o pagamento fosse também a cada um dos avós da criança, assim como a seus pais (REsp 1101213). Para o ministro Castro Meira, relator do caso na Segunda Turma, o Direito brasileiro não especifica quais parentes podem ser afetados pela situação. A seu ver, cabe ao magistrado avaliar, em cada caso, a razoabilidade da compensação devida pelo sofrimento decorrente da morte. Por isso, os avós poderiam figurar como requerentes da indenização por danos morais.

Também foi garantida pensão mensal aos pais aplicando a jurisprudência do Tribunal no sentido de que é devida a indenização por danos materiais em razão de morte ou lesão incapacitante de filho menor, independentemente de exercício efetivo de trabalho remunerado pela vítima. Nesses casos, a pensão deve ser fixada baseada nos limites legais de idade para exercício do trabalho e também na data provável de constituição de família própria da vítima, quando se reduz sua colaboração em relação ao lar original.

Mesmo quando a morte decorre de um acidente incomum, o STJ reconhece a responsabilidade do Estado. Para o Tribunal, o Estado tem responsabilidade objetiva na guarda dos estudantes a partir do momento em que eles ingressam na escola pública (REsp 945519). Seguindo o voto do ministro Luiz Fux, a Primeira Turma manteve a pensão aos pais de estudante morta devido à queda de uma árvore em escola pública durante uma aula de educação física.

O Estado e a saúde pública

A saúde da população também é responsabilidade do Estado. Um exemplo disso é a morte de paciente psiquiátrico no interior de um hospital público. O STJ considerou ter ocorrido falha no dever de vigiar na fuga e posterior suicídio do paciente, determinando ao Estado indenizar a família (REsp 433514). Para os ministros, a responsabilidade só é afastada se o dano resultar de caso fortuito ou força maior ou se decorrer de culpa da vítima.

O Tribunal também garantiu indenização a uma família devido ao falecimento da filha menor, que, diagnosticada por médico plantonista em hospital municipal, foi encaminhada para casa, mas, dois dias após, constatou-se erro na avaliação anterior, vindo a menor a falecer em decorrência de infecção generalizada (REsp 674586).

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Dano Moral e o Preso

STJ rejeita pedido de dano moral a preso em razão de presídio superlotado

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou um recurso especial em que um presidiário pretendia obter indenização por danos morais em razão de superlotação na prisão.

O presidiário ingressou com a ação de indenização contra o estado de Mato Grosso do Sul alegando que sofreu danos morais em razão da superlotação no Estabelecimento Penal Masculino de Corumbá. Condenado a cinco anos e quatro meses de reclusão por crimes previstos na antiga lei de tráfico e uso de entorpecentes (Lei n. 6.368/76 – revogada), ele sustentou que o presídio conta com 370 presos, quando a capacidade é para 130 detentos. Ele pretendia a condenação do estado ao pagamento de indenização no valor de sete salários mínimos.

Após ter o pedido julgado improcedente em primeiro e segundo grau, o preso recorreu ao STJ alegando violação do artigo 186 do Código Civil sob o fundamento de que a Constituição Federal (CF) é explícita ao afirmar que é assegurado ao preso o respeito à integridade física e moral que, se desrespeitada, caberá indenização por danos morais e ressarcimento por danos materiais. Ele alegou ainda que o “desprezo do poder público” causam-lhe sofrimentos que vão além da pena imposta, ocorrendo violação dos artigos 5º e 37 da CF.

O ministro Luiz Fux, relator do recurso, destacou primeiramente que a competência para examinar questões constitucionais é do Supremo Tribunal Federal. Ao STJ cabe apenas a análise da configuração da responsabilidade do Estado à luz do Código Civil. Nesse ponto, o tribunal estadual baseou-se na análise de fatos e provas para decidir que não havia nexo causal entre a suposta omissão do Estado e os danos morais, que sequer foram concretamente comprovados.

De acordo com o ministro Luiz Fux, analisar a configuração da responsabilidade subjetiva do Estado seria necessária a revisão de provas, o que é vedado pela Súmula n. 07 do STJ. Seguindo o voto do relator, a Primeira Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso.

Arrependimento de consumidor pode cancelar financiamento bancário


É possível o consumidor exercer o direito de arrependimento nas compras que faz, após a assinatura de contrato de financiamento com cláusula de alienação fiduciária. A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que aplicou as normas do consumidor à relação jurídica estabelecida entre o Banco ABN AMRO Real Ltda. e um consumidor de São Paulo.

O banco ingressou com um pedido de busca e apreensão de um veículo pelo inadimplemento de um contrato de financiamento firmado com o consumidor. Esse alegou que exerceu o direito de arrependimento previsto no artigo 49 do Código do Consumidor e que jamais teria se emitido na posse do bem dado em garantia. O Tribunal de Justiça do Estado entendeu que a regra era inaplicável no caso, pelo fato de o Código não servir às instituições bancárias.

A Terceira Turma reiterou o entendimento jurisprudencial quanto à aplicação do Código do Consumidor às instituições financeiras e considerou legítimo o direito de arrependimento. Segundo a decisão da relatora, ministra Nancy Andrighi, o consumidor, assinou dois contratos, o de compra e venda com uma concessionária de veículos e o de financiamento com o banco. Após a assinatura do contrato de financiamento, ocorrido fora do estabelecimento bancário, o consumidor se arrependeu e enviou notificação no sexto dia após a celebração do negócio.

De acordo com o art. 49, o consumidor tem sete dias a contar da assinatura do contrato para desistir do negócio, quando a contratação ocorrer fora do estabelecimento comercial. O banco alegava ainda que não seria possível o direito de arrependimento porque o valor repassado ao contrato de empréstimo já tinha sido inclusive repassado para a concessionária de veículos antes da manifestação de desistência do consumidor.

Segundo a relatora, não houve no caso formação nem ajuste de obrigações contratuais, motivos pelos quais deve ser julgado improcedente o pedido da ação de busca e apreensão.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A Majoração de Alimentos e o Princípio da Proporcionalidade

Este processo trata de tema que está a merecer a devida atenção, como venho sustentando, inclusive em sede doutrinária. (Manual de Direito das Famílias. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005, p. 468).

Na fixação dos alimentos, há que se atender ao critério da proporcionalidade, basta lembrar que é o Juiz quem fixa alimentos. Tanto é assim, que o Juiz pode fixaralimentos em valor superior ao pedido, sem que se possa falar em decisão ultra petita.

Também na ação de oferta de alimentos, possível é a fixação dos alimentos em montante maior do que o ofertado pelo autor, mesmo inexistindo pedido reconvencional. Mais, pode o magistrado deixar de homologar acordo quando o valor dos alimentos se afastam do critério da proporcionalidade. Todos esses exemplos evidenciam que, ao fixar os alimentos, invoca o juiz o princípio norteador para a quantificação do dever de alimentos: o princípio da proporcionalidade, que se cristaliza no binômio possibilidade/necessidade.

Fácil constatar que, quando da fixação dos alimentos não foi atendido a tal critério. Foi feito um acordo, enquanto a mulher estava grávida, em que o pai se dispôs a pagar 2 salários mínimos e mais despesas de educação. Só que ele percebe R$ 12.000,00 como jogador de futebol e mais o que eventualmente ganha com a venda deimagem. Esse valor corresponde a 5% do que ele ganha somente a título de salário. Assim, às claras, quando foram fixados os alimentos, por acordo, deixou de ser atendido o critério da proporcionalidade.

Assim, imperiosa a redefinição do encargo alimentar, ainda que não se trate de alteração dos alimentos por mudança quer das possibilidades do alimentante, quer das necessidades do alimentando. Quando ocorre alteração, possível a adequação no valor dos alimentos. Aqui a hipótese é absolutamente diferente. Trata-se do desrespeito ao critério da proporcionalidade quando da fixação dos alimentos. Portanto, não há falar em eventual afronta à coisa julgada. A possibilidade de se adequar os alimentos às necessidades de quem recebe e às possibilidades de quem paga é a concreção do princípio da proporcionalidade. Ora, quando os alimentos forem fixados sem atender a tal princípio norteador, cabe sempre, e a qualquer tempo, a retificação do quantum, sob pena de perpetuar-se injustiças, como no caso concreto.

MARIA BERENICE DIAS - Presidente - Agravo de Instrumento nº 70011932688, Comarca de Cachoeirinha: "POR MAIORIA NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO O RELATOR.



STJ E A IMPRESCRITIBILIDADE DO RESSARCIMENTO AO ERÁRIO


Ementa
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LITISCONSÓRCIO PASSIVO. DESNECESSIDADE. CABIMENTO DA AÇÃO. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. BENEFÍCIO CONCEDIDO DE FORMA IRREGULAR. DANO AO ERÁRIO PÚBLICO. PRAZO PRESCRICIONAL. OMISSÃO NA LEGISLAÇÃO DA AÇÃO CIVIL. PRAZO VINTENÁRIO. I - Descabido o litisconsórcio passivo com o Prefeito e vereadores que, à época, teriam aprovado a Lei Municipal que culminou por conceder benefício de forma irregular à ré na ação civil movida pelo Ministério Público Estadual, por não se subsumir à hipótese do art. 47 do CPC, sendo partes somente a benefíciária e a Prefeitura. II - É pacífico o entendimento desta Corte no sentido de ser o Ministério Público legítimo para propor ação civil pública na hipótese de dano ao erário, uma vez que se apresenta como defesa de um interesse público. III - A ação de ressarcimento de danos ao erário não se submete a qualquer prazo prescricional, sendo, portanto, imprescritível. IV - Recurso improvido.
Acórdão
Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, decide a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Os Srs. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, DENISE ARRUDA e JOSÉ DELGADO votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro LUIZ FUX.

REsp 810785 / SP ; RECURSO ESPECIAL
2006/0005942-1
Relator
Ministro FRANCISCO FALCÃO
Órgão Julgador
T1 - PRIMEIRA TURMA
Data do Julgamento
02/05/2006
Data da Publicação/Fonte
DJ 25.05.2006 p. 184
( www.notadez.com.br )

A Imprescritibilidade do Ressarcimento ao Erário Público

“(...) sustentei, anteriormente, em outra obra, a idéia da imprescritibilidade dessaes ações, defendendo-a sob um ponto de vista ideológico. Melhor refletindo sobre o assunto, parece-me que, ideologicamente, se mostra inaceitável tal tese, embora, pelo ângulo dogmático, não há alternativa hermenêutica. Até mesmo um crime de homicídio (art. 121, caput, CP) sujeita-se a prazo prescricional, por que uma ação por danos materiais ao erário escaparia desse tratamento? Dir-se-á que essa medida não constitui uma ‘sanção’, eis a resposta. Sem embargo, tal medida ostenta efeitos importantes e um caráter nitidamente ‘aflitivo’ de um ponto de vista prático. Ademais, gera uma intolerável insegurança jurídica a ausência de qualquer prazo prescricional. A melhor solução talvez fosse fixar um prazo (elevado) mínimo de prescrição para essas demandas, jamais proibir, expressamente, a configuração legislativa de prazos prescricionais para os casos de ressarcimento. De qualquer modo, já se disse que a reparação do dano não é uma sanção, motivo pelo qual fica de fora do Direito Administrativo Sancionador. O constituinte de 1988 mandou que o legislador ressalvasse, sempre, as ações de ressarcimento, deixando-as de fora dos prazos prescricionais que deveriam ser estabelecidos nas hipóteses de ilícitos contra a Administração Pública.

Trata-se de norma constitucional, que não está, por óbvio, sujeita a um juízo de inconstitucionalidade, sequer em face de princípios superiores, v.g., segurança jurídica. Não há ‘normas constitucionais inconstitucionais’, como se sabe. Nada impede, todavia, sob o ângulo doutrinário, uma crítica a essa espécie de postura. Aos operadores jurídicos, de qualquer sorte, cumpre respeitar a soberana decisão do constituinte, ajuizando e julgando as ações cabíveis”

(FÁBIO MEDINA OSÓRIO - Direito Administrativo Sancionador. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000. )