quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

CEF terá que indenizar pelo valor sentimental de joias roubadas do cofre


Dano moral não decorre da natureza do bem ou interesse lesado, mas do efeito da lesão sobre a vítima. Com essa consideração, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou pedido da Caixa Econômica Federal (CEF) para reverter condenação por danos morais, determinada em favor de vítima de roubo de joias guardadas em seu cofre.

A questão teve início quando uma advogada ajuizou ação contra a CEF, pedindo indenização por danos materiais e morais sofridos em decorrência da perda de joias que empenhara em garantia de contrato de mútuo em dinheiro.

Em primeira instância, o pedido foi julgado parcialmente procedente, tendo o juiz condenado a CEF ao pagamento de valor a ser apurado em liquidação por arbitramento pela perda material das joias, acrescida de 50% pelo dano moral sofrido, em vista do valor sentimental que os bens representavam para sua proprietária.

“São inegáveis, pois, os reflexos negativos acarretados à esfera psíquica da autora, abalada pela perda de joias da família, cujo valor sentimental que a elas atribui facilmente se apreende, por ser o que de ordinário ocorre, ensejando a reparação da parte de quem lhe causou aludidos danos”, assinalou o magistrado.
A CEF apelou, afirmando que o roubo de joias guardadas em cofre de segurança fornecido pela instituição bancária deveria gerar apenas, para o fornecedor, a responsabilidade pelo dano inerente à finalidade do próprio serviço.

O Tribunal Regional Federal da 1ª Região deu parcial provimento à apelação, aplicando a Súmula 43 do STJ, que trata da incidência da correção monetária. No recurso especial dirigido ao STJ, a CEF alegou, entre outras coisas, que a condenação em dano moral seria indevida, pois o ressarcimento do valor das joias empenhadas já recomporia o prejuízo causado pela mera subtração do patrimônio.

Ainda segundo a CEF, não poderia ser aplicada ao caso a Súmula 43 do STJ, quanto à correção monetária, pois esta só incide sobre dívidas preexistentes, o que não seria o caso dos autos, em que a atualização deveria ter como termo inicial a data da fixação da indenização por dano moral.

A Quarta Turma deu parcial provimento ao recurso da CEF, reconhecendo que o termo inicial dos juros de mora é a data da citação, e o da correção monetária é a data do arbitramento da indenização por dano moral (Súmula 362 do STJ).

Mas manteve a sentença quanto à indenização devida por danos morais. Para o ministro Luis Felipe Salomão, relator do caso, não há equiparação possível entre o dano patrimonial, que a CEF alega ter ocorrido única e exclusivamente, e o dano moral, que a instituição financeira diz ter sido suprido mediante o mero ressarcimento do valor pecuniário das joias empenhadas.

“A caracterização do dano moral não decorre da natureza do direito, bem ou interesse lesado, mas do efeito da lesão, do caráter da sua repercussão sobre a vítima, de modo que o roubo ou furto de joias de família dos cofres de instituição financeira repercutem sobre a autora, não pelo seu valor patrimonial, mas pelo seu intrínseco valor sentimental”, acentuou o ministro.

“O dano moral tem sua origem na repercussão da perda das joias de família e não no valor patrimonial destas, de modo que, como proficientemente decidido nas instâncias ordinárias, é devida a indenização a esse título”, acrescentou.

(www.stj.jus.br )

Honorários em ações trabalhistas são do trabalhador

Por José Jácomo Gimenes, Marcos César Romeira Moraes, Marcus Aurelio Lopes e Rony Ferreira
O processo do trabalho não é inteiramente justo com o trabalhador que procura o Judiciário. Costumeiramente ele tem que gastar até 30% de sua indenização de salários atrasados com honorários advocatícios. Na verdade, recebe somente uma parte de seu sagrado direito. É que a legislação e a jurisprudência trabalhista, desatualizadas nesse ponto, não permitem que o trabalhador seja ressarcido das despesas que teve com advogado para garantir seus direitos no Judiciário. É um defeito que deve ser urgentemente acertado.
Em 2003 foi proposto um Projeto de Lei para modificar a CLT nesse ponto, obrigando o vencido no processo do trabalho a ressarcir o vencedor nas despesas que este teve com seu advogado (no mesmo sentido de histórica regra do artigo 20 e Exposição de Motivos do Código de Processo Civil). A justificativa do Projeto original era o ressarcimento do trabalhador que custeou a despesa. Essa verba é conhecida como honorários de sucumbência, porque o vencido, o sucumbente, é quem paga. Nada mais justo e necessário.
O Projeto ficou rodando pelo Congresso. Em novembro de 2011, com relatoria de outro deputado, foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, num pacote de modificações da CLT, porém com mudança injusta na redação, determinando que o vencido pague honorários de sucumbência aos advogados (Projeto de Lei 3.392/2004, parágrafo 2º do artigo 791 da CLT). A oportunidade de correção de injustiça contra o trabalhador está sendo desviada.
Em caso de aprovação definitiva como está, com a alteração do Projeto original, o trabalhador vai continuar sendo injustiçado. Receberá bem menos que a indenização realmente devida e o advogado, que costumeiramente já recebe honorários contratuais sobre o resultado do processo, muitas vezes até elevados de 30%, receberá mais os honorários de sucumbência, entre 10% a 20%, podendo chegar a 50% do valor da ação.
O trabalhador que não teve seu direito atendido amigavelmente pelo empregador, além do desgaste e demora do processo judicial, receberá bem menos que o correto. O devido processo legal, instrumento do Estado Democrático, que tem por fundamento o justo, a integral reparação do ofendido, estará sendo desatendido por interesses corporativos. O Judiciário Trabalhista continuará defeituoso nesse ponto.
A propósito, o artigo 16 da Lei 5584/1970 já estabelece que os honorários advocatícios, nos casos de assistência judiciária, são devidos ao sindicato profissional que patrocina a causa e não ao advogado. Portanto, a legislação já tem por fundamento que os honorários de sucumbência são destinados ao ressarcimento dos gastos com o patrocínio da causa e não para pagamento ao advogado, remunerado por contrato ou salário. O Projeto deveria seguir o mesmo princípio e reverter os honorários de sucumbência ao trabalhador, para indenizar as despesas que teve com advogado no processo.
É aplicável ao caso a lição do ministro Joaquim Barbosa do Supremo, na ADI 1.194, acompanhando votos de colegas: “Os dispositivos impugnados, ao disciplinarem que a verba de sucumbência pertence ao advogado, não promovem propriamente a rule of law, mas o rule of lawyers. Com isso, não se incrementa a proteção judiciária, mas apenas se privilegia certa classe de profissionais que devem atuar sempre em interesse da parte que representa...”
É nesse sentido também o voto ministro Cezar Peluso, proferido na mesma ADI, no caso da transferência dos honorários de sucumbência ao advogado afronta o devido processo constitucional substantivo: "Penso que tal norma também ofenderia o princípio do devido processo legal substantivo, porque está confiscando à parte vencedora, parcela que por natureza seria destinada a reparar-lhe o dano decorrente da necessidade de ir a juízo para ver sua razão reconhecida."
Apesar da farta doutrina explicando que os honorários de sucumbência têm natureza indenizatória e pertencem ao vencedor do processo, apesar da segura indicação do Supremo na ADI 1.194, apesar do artigo 20 e Exposição Motivos do CPC no mesmo sentido, apesar dos princípios da reparação integral e devido processo legal substantivo (o processo judicial deve ser adequado para atingir seu objetivo constitucional, integral reparação do vencedor, inclusive das despesas), o trocadilho do ministro Joaquim Barbosa, infelizmente, parece estar se realizando: promoção do processo do advogado em detrimento do devido processo legal, no Projeto de alteração da CLT e também no Projeto do novo CPC.
Não é certo transferir verba indenizatória do trabalhador reclamante para o advogado, profissional que já recebe remuneração decorrente de contrato. A sociedade, sindicatos, processualistas, Ministério Público e demais órgãos de defesa dos direitos difusos e do trabalhador devem ficar atentos para a mudança. Especialmente quanto à efetiva realização do devido processo legal substantivo e justo tratamento do jurisdicionado, consumidor do serviço público judicial.

Medidas de ressarcimento ao erário

O ressarcimento ao erário se aproxima mais da teoria da responsabilidade civil do que penal ou das sanções administrativas, pelo que não se submete ao conceito de sanção administrativa nos mesmos termos em que ocorre com outras medidas, até porque a obrigação de ressarcir é uma restituição ao estado anterior. Fora de dúvida, não se trata de uma sanção administrativa, mesmo que assim venha denominada na legislação pertinente.
De fato, medidas ressarcitórias, ainda que dotadas de finalidades intimidatórias, não podem, pura e simplesmente, ser tratadas como sanções administrativas. Tal é o caso, por exemplo de medidas fiscais gravosas e de tantas outras que eventualmente ostentem apenas a aparência sancionatória, carecendo, sempre, de algum de seus pressupostos, entre os quais assume vulto o elemento finalístico ou teleológico. O que importa ressaltar, nesse contexto, é que as medidas de cunho ressarcitório não se integram no conceito de sanção administrativa, pois não assumem efeito aflitivo ou disciplinar, não ambicionam a repressão, mas sim a reparação do dano, assumindo conteúdo restituitório, reparatório, submetendo-se, nesse passo, a princípios próprios, específicos, mais próximos, naturalmente, do Direito Civil.
Não obstante, o Direito da responsabilidade civil, progressivamente, vem assumindo proporções importante na esfera dos direitos fundamentais. O direito de propriedade tem lugar de destaque no rol dos direitos fundamentais e é sabido que os processos civis causam efeitos aflitivos importantes e suprimem esferas de cidadania, como créditos e participação das pessoas em instâncias relevantes de convívio social. Desse modo, imperioso notar que os direitos são também observados, com vigor, nessa esfera. Vale observar que as instâncias punitivas e não punitivas têm se aproximado em termos de garantias dos direitos individuais, essa é uma tendência notória. O impacto das medidas ressarcitórias sobre direitos patrimoniais pode ser de tal ordem que se verifica violência aos direitos fundamentais abrigados constitucionalmente. Daí a importância do devido processo legal.

(Fábio Medina Osório - Direito Administrativo Sancionador - 3ª edição, revista, atualizada e ampliada)

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Agravo contra antecipação de tutela ou medida liminar não pode ser retido


O agravo interposto contra decisão que concede tutela antecipada ou impõe medida liminar não pode ser convertido em agravo retido. A decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu o direito líquido e certo do Banco do Brasil (BB) a ter agravo processado e julgado pelo Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL).

Em ação movida pelo Município de Campo Alegre (AL), o juiz determinou a restituição de R$ 174 mil às contas do erário, sob pena de multa diária de R$ 5 mil em caso de atraso. A tutela antecipada reconheceu o erro do banco quanto à destinação de depósitos que deveriam ter sido creditados em favor do município.

O BB interpôs agravo de instrumento contra a antecipação de tutela, porém o relator do caso no TJAL determinou sua conversão em agravo retido, que só é julgado posteriormente, quando da apelação.

O banco impetrou então mandado de segurança buscando o processamento do agravo de instrumento, mas o relator da ação indeferiu liminarmente o pedido, por inexistência de direito líquido e certo do BB. A instituição apresentou agravo interno contra a decisão individual, porém os desembargadores do TJAL mantiveram o entendimento do relator.

Teratologia

Com a decisão colegiada, o BB buscou o STJ. Ao julgar o recurso em mandado de segurança do banco, a ministra Nancy Andrighi explicou que a sistemática adotada a partir de 2005 impõe a conversão do agravo de instrumento em agravo retido, exceto quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação.

“Nesse contexto, em se tratando de decisões liminares ou antecipatórias da tutela, o agravo contra elas interposto deve ser, obrigatoriamente, de instrumento. Esse entendimento se sustenta no fato de que, dada a urgência dessas medidas e os sensíveis efeitos produzidos na esfera de direitos e interesses das partes, não haveria interesse em aguardar o julgamento da apelação”, esclareceu.

Para a relatora, é patente o risco de dano decorrente da antecipação de tutela na hipótese de improcedência do mérito, que sujeitaria o banco “ao moroso processo executivo deferido à fazenda pública”.

“Clara, portanto, a teratologia da decisão recorrida, inexistindo motivo para obstar o regular processamento do agravo de instrumento do recorrente”, concluiu.

A decisão, unânime, apenas determina ao TJAL que não converta o agravo de instrumento em retido e dê seguimento ao julgamento do mérito do pedido do BB, mas não avança quanto ao cabimento ou adequação da tutela antecipada.

 

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Uso de documento falso e autodefesa

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) modificou o entendimento que vinha mantendo e concluiu que o uso de documento falso com o objetivo de ocultar antecedentes criminais não constitui exercício legítimo do direito de defesa. A Turma decidiu que a alegação de autodefesa, nessas situações, não encontra respaldo constitucional. A questão foi decidida no julgamento de habeas corpus em que o réu pedia para não ser incriminado pelo uso de documento falso.

Até agora, a Quinta e a Sexta Turma do STJ, responsáveis pelo julgamento de matéria penal, adotavam a tese de que o uso de documento falso com o propósito de manter a liberdade não configurava crime, por constituir hipótese de autodefesa assegurada pelo artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal. A mudança de posição da Quinta Turma decorreu de entendimento fixado mais recentemente pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Para se alinhar à posição do STF, os ministros da Quinta Turma declararam que, embora o direito à liberdade seja importante garantia individual, seu exercício não é absoluto e encontra barreiras em normas de natureza penal. No caso analisado, o réu era foragido e apresentou documento de identidade e de habilitação falsos quando abordado pela polícia.

O habeas corpus foi interposto contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), que condenou o réu a dois anos e 11 meses de reclusão em regime inicial semiaberto por violação ao artigo 304 do Código Penal. O órgão entendeu que é direito do Estado saber contra quem se propõe ação penal, e obrigação do acusado revelar sua identidade.

A defesa do réu ingressou no STJ para que fosse aplicada a jurisprudência segundo a qual sua atitude não seria crime. Argumentou que ele estaria sofrendo constrangimento ilegal, pois a apresentação de documento para preservar a liberdade estaria amparada no inciso LXIII do artigo 5º, que afirma: “O preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado.”

O relator do habeas corpus, ministro Jorge Mussi, destacou que o STF, ao julgar o recurso extraordinário 640.139, decidiu que o princípio constitucional da autodefesa não alcança aquele que se atribui falsa identidade perante autoridade policial com o objetivo de ocultar maus antecedentes. Diante disso, afirmou o ministro, não há mais como sustentar o entendimento de atipicidade da conduta que vinha sendo adotado pelo STJ.

A decisão do STF, segundo o ministro, embora não tenha força vinculante, foi proferida em matéria na qual ficou reconhecida a repercussão geral, de modo que deve ser observada a finalidade desse instituto, que é uniformizar a interpretação constitucional.
Mussi assinalou que o uso de identidade falsa não encontra amparo na garantia de permanecer calado, tendo em vista que esta abrange somente o direito de mentir ou omitir sobre os fatos que são imputados à pessoa e não quanto à sua identificação.
 

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Gestante em contrato de experiência tem direito à estabilidade

A 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu o direito de uma trabalhadora gestante de receber salários e demais verbas correspondentes ao período de estabilidade, mesmo em período de contrato de experiência. A Turma seguiu o voto do relator, ministro Walmir Oliveira da Costa, no sentido de que o direito independe da modalidade do contrato de trabalho, e que o item III da Súmula 244 do TST, que exclui a estabilidade nos contratos de experiência, está superado pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.
O pedido formulado pela gestante em reclamação trabalhista ajuizada contra a empregadora, Turqueza Tecidos e Vestuários Ltda., foi inicialmente indeferido em primeiro e segundo graus. O Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO), ao manter a sentença contrária à pretensão da trabalhadora, entendeu que o direito da gestante ao emprego, previsto no artigo 10, inciso II, alínea ‘b' do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), não abrangeria os contratos firmados sob a modalidade de experiência. "É que os contratos de experiência têm sua extinção com o advento do termo final ou da condição resolutiva", assinalou o Regional. "A extinção do contrato em face do seu término não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa".
Ao recorrer ao TST, a empregada sustentou que o único critério previsto para a estabilidade provisória é a confirmação da gravidez durante o contrato. Uma vez constatada essa condição, a gestante tem assegurado o emprego até cinco meses após o parto.
O ministro Walmir Oliveira a Costa acolheu a argumentação. "A garantia visa, em última análise, à tutela do nascituro", assinalou. Em seu voto, o relator lembrou que o ADCT veda a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante desde a confirmação da gravidez até cinco meses depois do parto, sem distinção entre o contrato a prazo determinado, como o de experiência, ou sem duração de prazo.
"O único pressuposto do direito à estabilidade (e à sua conversão em indenização, caso ultrapassado o período de garantia do emprego) é a empregada encontrar-se grávida no momento da rescisão contratual, fato incontroverso no caso", afirmou. "Nesse cenário, é forçoso reconhecer que o item III da Súmula 244 não é impedimento para o reconhecimento da estabilidade, sendo irrelevante se o contrato fora celebrado sob a modalidade de experiência, que poderá ser transformado em prazo indeterminado".
Para o ministro Walmir Oliveira da Costa, o entendimento desse item da Súmula 244 encontra-se superado pela atual jurisprudência do STF, no sentido de que as gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime de trabalho, têm direito à licença maternidade de 120 dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. "Daí se deflui, portanto, que a decisão do TRT-GO divergiu da orientação da Suprema Corte, à qual incumbe a interpretação final da Constituição", concluiu.
Por unanimidade, a 1ª Turma acatou o recurso da gestante e condenou a empregadora a pagar os salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade, com juros e correção monetária.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Improbidade administrativa

A 1ª Câmara Cível do TJRS condenou por improbidade administrativa os ex-Prefeitos de Santa Cruz do Sul Sérvio Ivan Moraes, atualmente Deputado Federal, e José Alberto Wenzel, por promoção pessoal em anúncios publicados em jornais locais, pagos com verbas públicas. O julgamento ocorreu na última quarta-feira (7/12).
O Juízo da 2ª Vara Cível de Santa Cruz do Sul condenou Moraes por publicações nos jornais Folha do Rio Grande (duas vezes), Gazeta do Sul (cinco vezes) e Riovale. Já Wenzel, foi condenado por veiculações nos jornais Gazeta do Sul, Riovale e Arauto. Dos fatos elencados pelo MP no pedido inicial, não houve condenação no 1º Grau em relação à divulgação do concurso Rainha das Piscinas. Os dois foram condenados ao ressarcimento integral dos recursos públicos investidos nas publicações. Tanto o Ministério Público, como os dois réus, recorreram da sentença ao Tribunal de Justiça.
Para o relator, Desembargador Carlos Roberto Lofego Caníbal, não se caracteriza como ato de improbidade administrativa a publicação no jornal Gazeta do Sul, em julho de 2002, pelo então Prefeito Sérgio Ivan Moraes, do texto divulgando a premiação do Município pelo cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal. Também a homenagem às empresas Souza Cruz, pelo centenário, de abril de 2003, e a feita à Kannenberg, pelos seus 50 anos, em fevereiro de 2004 e dezembro de 2003, não infringem a legislação, destacou.
Em relação ao então Prefeito José Alberto Wenzel, não há motivo para condenação das homenagens realizadas ao Hospital Ana Nery, de setembro de 2008, ao Dia do Servidor Público, em outubro de 2006, ao Sr. Hansi Grolow, póstuma, em fevereiro e março de 2006.
O relator entende que não se justificam no interesse público, caracterizando-se, algumas, inclusive, como promoção pessoal do Administrador, pelo réu Moraes, as veiculações das homenagens à empresa Premium Tabacos do Brasil, em julho de 2003; ao 8º Batalhão de Infantaria Motorizado, em novembro de 2001, ao jornal Folha de Rio Grande, em abril de 2002. E também da publicação de cerca de 10 páginas, em uma única edição, do concurso Rainha das Piscinas do Vale do Rio Pardo 2004, no jornal Gazeta do Sul, quando a promoção do evento era da própria empresa do jornal e, o Município, mero apoiador.
E em relação ao réu Wenzel, o Desembargador Caníbal, entende que não houve justificativa para o gasto público da divulgação do concurso Rainha das Piscinas do Vale do Rio Pardo 2006. Destacou o magistrado que o desvio de finalidade aqui é alarmante, na medida em que a promoção do concurso cabe ao Grupo Gazeta de Comunicação, sendo o Município de Santa Cruz do Sul mero apoiador do evento. Também a homenagem ao Jornal Arauto, em setembro de 2006, que não se justifica, para fins de ser paga com dinheiro público, leia-se, do cidadão.
O relator confirmou a obrigação dos dois réus ressarcirem aos cofres públicos os recursos utilizados nas publicações e aplicou a cada um o pagamento de multa civil no valor de uma vez o dano. Os valores serão fixados em liquidação de sentença.
O Desembargador Luiz Felipe Silveira Difini acompanhou o voto do relator.
Minoritário - Já o Desembargador Irineu Mariani divergiu na fixação das penas para também aplicar aos réus a pena de suspensão dos direitos políticos e a proibição de contratação com o Poder Público pelo prazo mínimo de cinco anos.
AC 70036844470

Extravio do cartão de crédito. Responsabilidade solidária do Banco.

São nulas as cláusulas contratuais que impõem exclusivamente ao consumidor a responsabilidade por compras realizadas com cartão de crédito extraviado até o momento da comunicação do fato à empresa administradora. Esse entendimento foi reiterado em mais uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Em 2004, um consumidor do Paraná teve seu cartão de crédito trocado após uma compra em estabelecimento comercial do estado. Ele só percebeu que estava com o cartão de outra pessoa quando precisou fazer compra na internet, cinco dias depois. O cliente comunicou o extravio imediatamente ao BankBoston Banco Múltiplo, quando foi informado que seu cartão havia sido usado no período, totalizando gastos de quase R$ 1,5 mil. Na mesma ocasião, ele solicitou ao banco o cancelamento do débito, mas não teve êxito. A bandeira do cartão de crédito era Visa.

O Tribunal de Justiça do Paraná havia afastado a responsabilidade do banco pelo extravio com base no entendimento de que caberia ao titular guardar o cartão de forma segura, além de ver se o estabelecimento havia devolvido seu cartão de maneira correta após o pagamento da compra. Para os desembargadores, o banco seria responsabilizado apenas no caso de débitos posteriores à comunicação do fato.

Foi considerado ainda que seria incorreto responsabilizar o banco solidariamente quanto ao fato de a assinatura do canhoto das compras, feitas durante os cinco dias de extravio, não corresponder à assinatura do cartão. Os desembargadores afirmaram que essa responsabilidade é exclusiva do estabelecimento comercial.

A relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi, afirmou que os artigos 14 e 18 do Código de Defesa do Consumidor indicam que todos aqueles que participam da introdução do produto ou serviço no mercado devem responder solidariamente por eventuais danos. A ministra disse ainda que fica a critério do consumidor a escolha dos fornecedores solidários, conforme sua comodidade ou conveniência.

Segurança

Sobre a necessidade de conferência da assinatura, a ministra ressaltou que, antes da criação dos cartões com chip, como no caso analisado, esse era o principal procedimento de segurança a ser observado pelo fornecedor, pois não havia outro meio de confirmar se o consumidor era ou não titular do cartão em uso.

A ministra afirmou ainda que uma das grandes vantagens dos cartões de crédito é a segurança: “O consumidor é levado a crer que se trata de um sistema seguro e que, mesmo havendo furto, estará protegido contra o uso indevido por terceiros.”

Nancy Andrighi considerou abusiva a cláusula do contrato firmado com o banco, que determina a responsabilidade exclusiva do cliente pelo cartão de crédito. Na opinião da relatora, ainda que os débitos tenham sido feitos antes de o cliente ter comunicado o extravio, esse fato não pode afastar a responsabilidade do banco.

Há precedente nesse mesmo sentido, de que “são nulas as cláusulas contratuais que impõem ao consumidor a responsabilidade absoluta por compras realizadas com cartão de crédito furtado até o momento da comunicação do furto”. Outra decisão anterior afirma que cabe à administradora de cartões, em parceria com a rede credenciada, conferir a idoneidade das compras realizadas, por meio de métodos que dificultem ou impossibilitem fraudes e transações realizadas por estranhos em nome de seus clientes, tenha ou não ocorrido descuido do cliente.

Para a ministra, o aviso tardio do extravio não pode ser considerado fator decisivo do uso incorreto do cartão pelo cliente. “Independente da comunicação, se o fornecedor cumprisse sua obrigação de conferir a assinatura do titular no ato da compra, a transação não teria sido concretizada”, concluiu Nancy Andrighi.

Seguindo o voto da relatora, a Turma deu provimento ao recurso do consumidor para acolher o pedido de inexistência parcial de débito e para condenar o banco
a arcar com as despesas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$ 2 mil.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Juros, incidência e dano moral

Quem tiver que receber ou que pagar indenização por dano moral precisa ficar atento. De acordo com decisão da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, os juros de mora, neste caso, incidem a partir da data do evento danoso. O entendimento foi firmado durante julgamento de recurso da empresa Folha da Manhã S.A., dona do jornal Folha de S.Paulo, condenada a indenizar o jornalista Marcelo Fagá, morto em 2003.
O entendimento já prevalecia no STJ, mas parte dos ministros defendia sua reforma, diante das peculiaridades do caso. Reportagem do jornal, de março de 1999, envolveu o nome do jornalista em supostas irregularidades ocorridas no período em que trabalhou na assessoria de imprensa da prefeitura de São Paulo, durante o governo Celso Pitta.
De acordo com a notícia, o jornalista teve o salário revelado e seu nome figurou numa lista intitulada "Os homens de Pitta". Além disso, apareceu em textos que falavam sobre "máfia da propina", "uso da máquina" e "cota de Nicéa Pitta", em referência a cargos preenchidos por indicação da mulher do então prefeito.
O Tribunal de Justiça de São Paulo acolheu o pedido do jornalista e determinou uma indenização por danos morais no valor de 200 salários mínimos, com juros de mora contados desde a data do fato. Os desembargadores entenderam que o jornal não se limitou a descrever os fatos noticiados, passando a adjetivar os envolvidos e manipulando, com as técnicas de imprensa, o pensamento de seus leitores.
A empresa recorreu apenas em relação aos juros moratórios. De acordo com a Folha da Manhã, o artigo 407 do Código Civil, determina que "os juros de mora devem ser contados a partir do momento em que se tornou líquida a obrigação da requerente em indenizar, ou seja, no momento em que foi proferida a sentença".
A relatora do caso, ministra Isabel Gallotti, votou no sentido de que a fluência dos juros moratórios deveria começar na data do trânsito em julgado da condenação. Até que os ministros Sidnei Beneti, Nancy Andrighi, Luis Felipe Salomão, Paulo de Tarso Sanseverino e Villas Bôas Cueva divergiram.
O ministro Sidnei Beneti, ao inaugurar a divergência, disse que o acórdão do TJ-SP está em conformidade com o entendimento do STJ. De acordo com a Súmula 54 do STJ, "os juros moratórios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual".
Já a ministra Isabel Gallotti, ao apresentar ratificação de voto após o início da divergência, esclareceu que não estava contradizendo a Súmula 54. Especificamente no caso de dano moral puro, que não tem base de cálculo, ela aplicava por analogia a Súmula 362, que determina que "a correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento".

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Instrumentalidade e referibilidade da tutela cautelar



















Instrumentalidade
A instrumentalidade não tem o mesmo viés finalístico dos autores clássicos. Não se concebe a tutela cautelar como instrumento do instrumento (como dito por Piero Calamandrei), mas sim, como instrumento apto a dar segurança à tutela do direito buscada pela parte no processo principal. Em outras palavras, concebe-se que a tutela jurisdicional visa tutelar o direito material. Neste sentido, a tutela cautelar assegura (confere segurança) a este direito material a ser tutelado pela Jurisdição.

Referibilidade
Significa que a tutela cautelar deve se referir a uma tutela de direito material ou a "uma situação substancial acautelada".  Kazuo Watanabe diz que a referibilidade dá-se no plano do direito material e que, sob o aspecto processual, seria a causa de pedir remota.

(Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Arenhart)






 

Tutela cautelar e tutela antecipatória

A tutela cautelar destina-se a assegurar uma situação jurídica ou a efetividade da tutela do direito material. É caracterizada pela instrumentalidade e pela referibilidade. A tutela cautelar é instrumento da tutela satisfativa, na medida em que objetiva garantir a sua frutuosidade. Sempre se refere a uma tutela satisfativa do direito. A tutela antecipatória, de outra parte, é satisfativa do direito material, permitindo a sua realização - e não a sua segurança - mediante cognição sumária ou juízo de verossimilhança. A tutela antecipatória, de lado hipóteses excepcionais, tem a mesma substância da tutela final, com a única diferença de que é lastreada em verossimilhança. A tutela antecipatória é a tutela final fundada em cognição sumária.
A tutela antecipatória não é instrumento de outra tutela. A tutela antecipatória satisfaz o demandante, dando-lhe o que almejou ao propor a demanda. O autor não quer outra tutela além daquela obtida antecipadamente, diversamente do que sucede quando pede a tutela cautelar, sempre predestinada a dar efetividade a uma tutela jurisdicional do direito. A tutela antecipatória também não aponta para uma situação substancial diversa daquela tutelada, ao contrário da tutela cautelar, que necessariamente faz referência a uma situação tutelável ou a outra tutela do direito material.

(Código de Processo Civil comentado artigo por artigo - 2ª edição revista, atualizada e ampliada -  Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero)

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Cancelamento de protesto e pagamento de custas

Cartórios não podem condicionar cumprimento de ordem judicial a pagamento de custas

Oficiais de instituições cartorárias não podem condicionar o cumprimento de ordem judicial ao pagamento prévio de custas. A decisão, por unanimidade, é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que negou provimento a recurso especial de um oficial de cartório do Rio de Janeiro, que se recusou a efetuar cancelamento de protesto, impondo como condição o pagamento prévio das custas.

Tudo começou com a ação de indenização por danos morais proposta por uma cliente do Banco do Brasil, que teve o nome protestado no Cartório do 5º Ofício de Protesto de São Gonçalo (RJ), por suposta falta de pagamento a uma escola. Segundo afirmou, a instituição bancária e a educacional não observaram que o pagamento era feito por boleto bancário, o qual não está elencado no rol de títulos executivos extrajudiciais.

A ação foi julgada procedente, para condenar o banco e a escola ao pagamento de R$ 7 mil a título de compensação por danos morais. A sentença determinou, ainda, que o oficial responsável pelo cartório excluísse o protesto no prazo de 48 horas. Apesar de a cliente ter levado o ofício diretamente ao oficial, ele se negou a obedecer à ordem judicial em razão da falta de pagamento de emolumentos.

A cliente do banco entrou na Justiça contra o oficial do cartório, que foi condenado ao pagamento de 5 mil reais como indenização por danos morais. Ambos apelaram, mas o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) negou provimento a ambas as apelações, entendendo que não poderia o oficial impor condições para cumprir a ordem judicial. O pedido para aumentar o valor da indenização também foi negado, pois estava dentro dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

“A indenização por dano moral deve ser fixada com moderação para que seu valor não seja tão elevado a ponto de ensejar enriquecimento sem causa para a vítima, nem tão reduzido que não se revista de caráter preventivo e pedagógico para o seu causador”, asseverou o relator da apelação.

No recurso para o STJ, o oficial do cartório alegou que a decisão do TJRJ ofendeu o artigo 26, parágrafo 3º, da Lei 9.492/97. Segundo a defesa, a lei é “cristalina” no sentido de que deve haver o pagamento dos emolumentos pelo interessado no cancelamento do protesto, ou seja, por aquele que “comparece à serventia requerendo o cancelamento, ainda que por determinação judicial”.

O dispositivo legal citado no recurso afirma que “o cancelamento do registro do protesto, se fundado em outro motivo que não no pagamento do título ou documento de dívida, será efetivado por determinação judicial, pagos os emolumentos devidos ao tabelião”.

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, tanto a Lei 9.492 como a Lei 8.935/94 determinam que, “em qualquer hipótese de cancelamento, haverá direito a emolumentos, recebidos diretamente das partes”. A jurisprudência do STJ firmou o entendimento de que o cancelamento do protesto, mediante o pagamento das custas cartorárias, compete ao devedor, quando se tratar de protesto devido.


“Em se tratando de cancelamento do protesto determinado por ordem judicial, contudo, deve-se analisar o conteúdo dessa determinação: se condicionada ao pagamento de emolumentos ou se impositiva, que deve ser cumprida sob qualquer condição”, afirmou a ministra Nancy Andrighi.

Ela disse que a ordem do magistrado foi clara, não tendo sequer fixado multa em caso de descumprimento. “Emanada ordem judicial impositiva para que o oficial do cartório efetuasse o cancelamento do protesto, cabia-lhe o cumprimento da medida, e não estabelecer condição ao seu implemento inexistente no ofício judicial, qual seja, o pagamento prévio dos emolumentos cartorários”, concluiu.

A relatora comentou ainda que, como há exigência legal dos emolumentos, “seria mais razoável” se esse tipo de ordem judicial indicasse o responsável pela obrigação. De qualquer forma, acrescentou, em vez de não cumprir a ordem e usar o protesto como pressão para que a pessoa prejudicada por ele pagasse os emolumentos, o oficial do cartório poderia ter provocado o juízo a estabelecer a quem caberia arcar com as despesas.

Para Nancy Andrighi, o oficial cometeu ato ilícito. “Além do notório prejuízo que referida conduta acarretou à parte favorecida pela ordem judicial descumprida, as delongas perpetradas pelo oficial, assim como todo descumprimento de ordem judicial, acabam por ocasionar ao Poder Judiciário descrédito junto à sociedade, situação que deve ser reprimida a todo custo”, afirmou a ministra.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Direito à reparação por dano moral é transmissível aos herdeiros

Ainda que o direito moral seja personalíssimo – e por isso intransmissível –, o direito de ação para buscar a indenização pela violação moral transmite-se com o falecimento do titular do direito. Portanto os seus herdeiros têm legitimidade ativa para buscar a reparação. No caso, os herdeiros de um juiz de direito pleiteavam a habilitação na ação de indenização proposta por ele, ação que a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou procedente.

A ação de indenização foi ajuizada pelo juiz de direito após ter sido alvo de “graves ofensas” contidas em representação apresentada por uma empresa ao Ministério Público de São Paulo – resultando na determinação de abertura de procedimento penal pela Polícia Civil. As ofensas ao magistrado foram feitas após sentença condenatória desfavorável à empresa.

O pedido de reparação foi julgado procedente pelo juízo de primeiro grau. Depois do falecimento do juiz, os herdeiros requereram habilitação para figurar em seu lugar, no polo ativo da ação, pedido deferido pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

A habilitação foi, entretanto, impugnada pela empresa, sob a alegação de que, por causa do caráter personalíssimo do direito moral, a transmissão da ação indenizatória aos herdeiros seria impossível.
Direito de ação
Porém, para a ministra relatora, Nancy Andrighi, o direito à indenização por violação moral transmite-se com o falecimento do titular do direito, ou seja, tanto os herdeiros quanto o espólio têm legitimidade ativa para ajuizar ação de reparação por danos morais. “O direito que se sucede é o de ação, de caráter patrimonial, e não o direito moral em si, personalíssimo por natureza e, portanto, intransmissível”, explicou a ministra.

Em outro ponto analisado no recurso, a empresa pedia a aplicação analógica do artigo 142 do Código Penal – que afirma não haver injúria ou difamação punível nas ofensas feitas em juízo (na discussão da causa) pelas partes ou procuradores.

No entanto, de acordo com a relatora, essa “excludente de antijuricidade pressupõe a existência de uma relação jurídica processual”, ou seja, a ofensa deve ter sido lançada em juízo, em momento de debate entre as partes, situação na qual “o legislador admitiu a exaltação de ânimos”. Além disso, o dispositivo não diz respeito às ofensas dirigidas ao juiz, uma vez que ele não é parte no processo.

Já o valor da indenização, alegado excessivo pela empresa, foi reduzido pela ministra Nancy Andrighi. Segundo ela, é evidente o exagero na fixação da indenização (correspondente a 15 meses de subsídios do juiz, valor que hoje superaria os R$ 300 mil), “tendo em vista que, para situações inegavelmente mais graves, como aquelas envolvendo a morte de um ente querido ou a existência de sequelas físicas”, o STJ não chega a valores tão altos. Dessa forma, a reparação por danos morais foi fixada em R$ 200 mil.
 

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Tutela cautelar e tutela de remoção do ilícito

A tutela de remoção do ilícito objetiva a eliminação dos efeitos concretos posteriores à prática de um ato ilícito, não se confundindo com a tutela de inibição do ilícito nem com a tutela contra a probabilidade do dano. No caso de exposição à venda de procudto com composição proibida, por exemplo, basta, para se obter a tutela de remoção do ilícito (mediante busca e apreensão), a demonstração da prática de ato contrário ao direito. Porém, como a tuela de remoção do ilícito, por mera consequência, impede a produção do dano, confundiu-se tutela contra o ilícito já praticado (remoção do ilícito) e tutela cautelar. Se a busca e apreensão, ao remover o ilícito, acaba colaborando com a prevenção, a verdade é que o seu fundamento não está na probabilidade do dano, mas sim na prática do ilícito. Na ação que visa à obtenção de tutela de remoção do ilícito não se admite a discussão do dano, não devendo ojuiz perguntar sobre a probabilidade de dano para conceder a tutela jurisdicional. A emissão de mandado de busca e apreensão de produto com composição ilícita constitui técnica processual que visa à obtenção de tutela de remoção do ilícito, que satisfaz por si mesma. A tutela de remoção do ilícito é satisfativa, não se revestindo da instrumentalidade característica da tutela cautelar. A tutela de remoção deve ser buscada através de ação estruturada com base nas técnicas processuais dos arts. 461 e 461-A, CPC.

(Código de Processo Civil comentado artigo por artigo - Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero - 2ª edição revista e ampliada)

Tutela cautelar e tutela inibitória

A tutela cautelar é instrumento de outra tutela, enquanto a tutela inibitória é uma tutela autônoma, também dita satisfativa. A tutela inibitória tem como pressuposto a ameaça da prática de ato contrário ao direito, podendo ser utilizada não apenas quando se teme uma primeira violação, mas também quando se teme a sua repetição ou mesmo a continuação da atividade ilícita. De modo que a tutela inibitória pode impedir a publicação de notícia lesiva a direito da personalidade ou mesmo a difusão da publicação de notícia lesiva a direito da personalidade, assim como inbir a utilização de marca comercial ou a repetição do seu uso. Pode inibir ainda a continuação da atividade ilícita, como o prosseguimento de atividade poluidora. A tutela inibitória, ao contrário da tutela cautelar, não é uma tutela instrumental. A tutela inibitória é uma tutela tão autônoma quanto o é a tutela ressarcitória. A demanda em que se postula tutela inibitória (art. 461, CPC) é ação principal, bastante em si, ao passo que a tutela cautelar é vinculada a  outra tutela (art. 806,CPC). Como a tutela inibitória exige técnicas processuais idôneas e procedimentos adequados à prestação da tutela jurisdicional de modo efetivo, a demanda cautelar - antes da introdução dos instrumentos capazes de permitir a obtenção da tutela específica no Código de Processo Civil (por exemplo, arts. 461 e 461-A) - foi utilizada como meio para  a obtenção da tutela inibitória. Atualmente, quem pretende obter tutela inibitória - por exemplo, tutela capaz de impedir a violação de direito da personalidade ou de propriedade intelectual - deve propor ação construída com base nas técnicas processuais do art. 461, CPC. Nunca ação cautelar, que, por exigir uma ação principal (art. 806, CPC), não se presta à obtenção de tutela inibitória ou de qualquer tutela satisfativa do direito material.

(Código de Processo Civil comentado artigo por artigo -  Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero - 2ª edição revista e ampliada)

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Sistema prisional e o cumprimento de pena em casa

Réu pode cumprir pena em casa se prisão é precária

O condenado ao regime aberto somente irá para o sistema prisional se ele atender rigorosamente os requisitos da Lei de Execuções Penais (LEP). Caso contrário, o Judiciário pode determinar o cumprimento da pena em regime domiciliar para garantir os direitos fundamentais. Com este entendimento, a 6ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve a prisão domiciliar de um réu, diante da precariedade do sistema carcerário. O acórdão é do dia 22 de setembro.
O caso é originário da Comarca de Porto Alegre. O Ministério Público interpôs Agravo de Execução Criminal contra a Vara de Execuções Criminais (VEC) de Porto Alegre, que concedeu o benefício da prisão domiciliar a um apenado. O juiz Alexandre de Souza Costa Pacheco tomou a decisão em função da precária situação do sistema carcerário. O juiz reconheceu o excesso de execução individual, pois, na sua percepção, as Casas do Albergado não cumprem a LEP e ainda incentivam a criminalidade.
‘‘Entendo que a solução emergencial que mais se ajusta ao caso concreto e à realidade do precário sistema prisional do Estado, de modo a respeitar o direito do apenado e também o das demais pessoas, que pugnam por segurança, é a de permitir que os apenados em regime aberto venham a cumprir pena nas condições de prisão domiciliar. Outrossim, ressalto que o Código Penal permite que seja cumprida a pena do regime aberto em estabelecimento ‘adequado’, ao invés de Casa de Albergado, estando autorizado o magistrado, pelo artigo 115 da LEP, a estabelecer condições especiais para a concessão de regime aberto, sem prejuízo daquelas obrigatórias elencadas em seus incisos’’, afirmou o juiz.
Ele também considerou que o mero encaminhamento do apenado para o sistema prisional configuraria verdadeiro excesso de execução individual, conforme artigo 185 da LEP. E isso afronta os princípios da individualização da pena, da dignidade da pessoa, da humanidade e da vedação ao cumprimento de penas cruéis.
O MP recorreu. Alegou que a concessão da prisão domiciliar contraria o artigo 117 da LEP, pois restringiu-se a considerações sobre o sistema prisional, sem análise dos autos do processo de execução e da situação individual do apenado. Argumentou que a situação dos presídios é questão a ser resolvida pela administração. Alertou, finalmente, que a decisão recorrida termina com as penas restritivas de direito, quando fixada a privativa de liberdade em regime aberto, pois torna-se mais vantajoso ao condenado descumprir a pena restritiva e ser recolhido em prisão domiciliar.
O relator do Agravo na 6ª Câmara Criminal, desembargador Ícaro Carvalho de Bem Osório, entendeu que a sentença estava correta. Para ele, o sistema carcerário brasileiro não atingiu seus objetivos pedagógicos, sendo visíveis as precariedades dos estabelecimentos prisionais, que geram condições subumanas para os detentos, devido à superlotação e a inércia daqueles órgãos que deveriam sanar tal problema.
‘‘Não se trata de violar a coisa julgada, desrespeitar o disposto em lei federal ou de promover a insegurança, de vez que o fato gerador é a inobservância, pelo Poder Executivo, de direitos fundamentais dos segregados que estão aos seus cuidados — sobretudo a dignidade da pessoa humana —, o que faz ser imperativo ao Poder Judiciário, forte no sistema de freios e contrapesos — que a Constituição adota, porque democrático e de direito o Estado — atuar de modo a corrigir-lhes as faltas, com vistas ao equilíbrio e ao alcance dos fins sociais a que referido sistema almeja, adotando as medidas necessárias à restauração dos direitos violados’’, concluiu o relator.
O voto que negou seguimento ao Agravo — confirmando a sentença — foi seguido pelos desembargadores Aymoré Roque Pottes de Mello e Cláudio Baldino Maciel.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

Causas de exoneração da pensão

A maioria daqueles que já passaram pelos dissabores de uma separação judicial, hoje simplesmente divórcio, já se deparou com questões ligadas à prestação alimentícia. Senão por conta dos filhos, por conta de ex-cônjuges dependentes financeiramente. Tratando dessa segunda hipótese, algumas questões devem ser analisadas invariavelmente para se concluir sobre a necessidade ou não de uma das partes pleitear alimentos, e da possibilidade ou não da outra parte prestar alimentos.
Dados como o nível de dependência financeira existente entre ambos durante a relação conjugal, bem como idade do potencial alimentado, qualificação profissional, condições de inserção do ex-cônjuge no mercado de trabalho, dentre outros, são pontos analisados para que se fixe ou não pensão alimentícia em favor do ex-cônjuge.
Todos esses “requisitos” sempre foram estudados justamente com o intuito de se verificar a configuração dos dois pontos alicerces do necessário binômio que leva à fixação da pensão alimentícia ente ex-cônjuges, quais sejam, a necessidade do alimentado e a possibilidade do alimentante.
Evidentemente, não há que se falar em pagamento de pensão alimentícia por um cônjuge a outro quando, ao se divorciarem, ambos estão inseridos no mercado profissional, aferindo rendas de maneira minimamente satisfatória, de modo que cada um seja capaz de manter seus próprios gastos pessoais em patamar semelhante ao havido durante a vigência do casamento. Nesse caso, inexistiria a “necessidade” por parte do alimentado. Da mesma forma, se nenhum dos dois possuir fonte de renda, inexistirá a “possibilidade” do alimentante.
Fato é que o binômio necessidade/possibilidade é invariavelmente analisado quando a questão é prestação de alimentos. No entanto, a peculiaridade de cada caso e os tempos modernos fazem com que determinadas questões acabem sendo analisadas de forma mais consciente pelos Tribunais, já que como diz o jargão popular, “os tempos mudaram”...
Com certeza, o ex-cônjuge de hoje em dia não pode ser comparado, sem nenhum desprestígio, é claro, àqueles que dedicaram sua vida à família e aos filhos no século passado e acabaram por experimentar as agruras de um divórcio atualmente!
A inserção destas pessoas no mercado de trabalho é quase inviável, infelizmente! Assim, não se pode imaginar que esses ex-cônjuges não terão direito a receber sua pensão alimentícia pelo tempo que lhe restar de vida, dentro dos termos legais.
No entanto, temos hoje um mercado de trabalho absolutamente aberto e propício à receber bons profissionais, principalmente as mulheres que outrora foram tão desprestigiadas! É certo que estas, muitas vezes deixam suas carreiras de lado com o incentivo do marido, na vigência do casamento, porém, não deixam de ter um grande potencial ao enfrentarem o divórcio com ainda muita vida produtiva pela frente! Nesses casos, dependendo das peculiaridades que acompanhem a situação que tentamos ilustrar, seria justo que a pensão alimentícia fosse “vitalícia”, ou dependesse unicamente do tão conhecido binômio necessidade/possibilidade?
Justamente diante desse cenário, o Superior Tribunal de Justiça decidiu, recentemente, que é possível a exoneração do pagamento de pensão alimentícia devida a ex-cônjuge mesmo sem ter havido alteração nas condições econômicas dos envolvidos que reflitam no mencionado binômio.
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao decidir dois processos semelhantes, concluiu que outros fatores, além da capacidade financeira que tanto influi no binômio necessidade/possibilidade, também devem ser considerados na análise do pedido de exoneração de pensão alimentícia fixada entre ex-cônjuges, como a capacidade de trabalho do alimentado e o tempo necessário para que ele recuperasse a condição econômica que detinha durante o relacionamento.
De acordo com o entendimento da relatora dos casos, Ministra Nancy Andrighi, é necessário “considerar também a possibilidade de desoneração de alimentos dissociada de uma mudança na fortuna dos envolvidos”, quando não tiver sido verificada mudança negativa ou positiva na condição econômica dos dois. “A essa circunstância fática devem ser agregadas e ponderadas outras mais, como a capacidade potencial do alimentado para o trabalho e o tempo decorrido entre o início da prestação alimentícia e a data do pedido de desoneração”, afirmou a Ministra.
Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a pensão alimentícia é determinada visando assegurar ao ex-cônjuge tempo hábil para sua inserção, recolocação ou progressão no mercado de trabalho, de modo que possa manter pelas próprias forças status social similar ao do período do relacionamento. O pagamento perpétuo só é determinado em situações excepcionais, quando, segundo a Ministra, há “a existência de uma das exceções à regra da temporalidade dos alimentos devidos a ex-cônjuge, que são a impossibilidade prática de inserção no mercado de trabalho ou a incapacidade física ou mental para o exercício de atividade laborais”.
Temos assim um novo panorama surgindo no que diz respeito à desoneração de pensão alimentícia fixada entre ex-cônjuges e é fácil perceber que este, é muito condizente à realidade atual.

Ana Cláudia Banhara Saraiva é advogada da Miguel Neto Advogados em São Paulo. www.conjur.com.br

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

Trabalhador doméstico e salário mínimo proporcional

Empregada doméstica que trabalha três dias na semana pode receber salário mínimo proporcional à jornada reduzida. Com esse entendimento, a 6º Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou Agravo de Instrumento apresentado por trabalhadora que pretendia rediscutir a questão no TST.
Segundo o relator, ministro Maurício Godinho Delgado, a decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região no sentido de que a empregadora podia pagar à trabalhadora salário proporcional ao tempo trabalhado está de acordo com a Orientação Jurisprudencial 358 da Seção Especializada em Dissídios Individuais 1 do TST.
Nos termos da OJ, é legal o pagamento ao trabalhador do piso salarial da categoria ou do salário mínimo proporcional à jornada reduzida contratada. E o salário mínimo previsto no artigo 7º, inciso IV, da Constituição Federal é fixado com base na jornada de trabalho de oito horas diárias e 44 horas semanais a que se refere o inciso XIII do mesmo dispositivo.
Durante o julgamento, o ministro Godinho destacou que, em relação ao tema, uma corrente considera que, como o trabalhador doméstico não tem jornada estabelecida em lei, não caberia a proporcionalidade do salário. Essa corrente defende, portanto, que o empregado doméstico tem sempre que receber o salário mínimo, não importando o número de dias trabalhados na semana. Entretanto, o relator concluiu que essa interpretação pode ocasionar distorções salariais.
FormalizaçãoO ministro Maurício Godinho afirmou ainda que a possibilidade de pagar o salário proporcional a quem presta serviços com jornada reduzida pode estimular a formalização dos contratos de trabalho de empregados domésticos. Por um lado, a jurisprudência predominante no TST considera que o serviço prestado no mínimo três vezes por semana tem caráter contínuo, caracterizando a relação de emprego. Em contrapartida, a carteira pode ser assinada com salário proporcional aos dias trabalhados, sem onerar o empregador. Outras turmas também já TST já admitiram essa possibilidade: a 2ª, 6ª, 3ª e a 1ª.
O relator verificou também que a empregada confirmara, em depoimento pessoal, que prestava serviços na casa da ex-patroa três dias por semana. "Com efeito, restou incontroverso que a empregada trabalhava em jornada reduzida e que seu salário era proporcional ao piso profissional dos domésticos", assinalou. "Adotar entendimento contrário demandaria necessariamente o revolvimento dos fatos e provas do processo", observou — o que não é possível no TST (Súmula 126). No mais, o ministro Maurício Godinho observou que não houve desrespeito às garantias constitucionais e, assim, negou provimento ao Agravo. A decisão foi unânime, com ressalva de fundamentação do ministro Augusto César Leite de Carvalho. Com informações da Assessoria de Imprensa do Superior Tribunal de Justiça.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

O novo regime das contratações públicas

Márcio Monteiro Reis e Fernando Villela de Andrade Vianna - 03/11/2011 - 10h27

Após acalorados debates, foi finalmente aprovada pelo Congresso Nacional a Medida Provisória 527/11, convertida na Lei Federal 12.462/11. Fica assim definitivamente instituído o RDC ( Regime Diferenciado de Contratações Públicas), que introduz novas regras para as contratações com o Poder Público. A decisão é voltada para projetos vinculados à realização dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 2016; da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol (Fifa 2013) e da Copa do Mundo Fifa 2014. Além disso, inclui obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da Federação, distantes até 350km das cidades sedes dos eventos esportivos acima mencionados (artigo 1º, incisos I, II e III).
O Regime Diferenciado de Contratações Públicas traz interessantes inovações do ponto de vista jurídico, que poderão, quem sabe, inspirar um eventual projeto maior de reforma da atual Lei de Licitações (Lei Federal 8.666/93), vigente há mais de 20 anos.
Não há dúvida de que o principal objetivo da nova legislação é conferir maior celeridade a essas contratações, procurando reduzir trâmites burocráticos e formalismos. Desta forma, se estabelece por lei a prioridade para as formas eletrônicas de contratação, admitindo-se excepcionalmente as presenciais (artigo 13).
Além disso, institui como regra geral a desejável inversão de fases entre a habilitação e o julgamento, permitindo que a longa análise documental seja realizada apenas em relação ao licitante que apresentar a melhor proposta, evitando intermináveis impugnações e recursos referentes aos documentos de todos os licitantes. Trata-se de louvável instrumento que prestigia a eficiência e traz nova dinâmica ao procedimento, certamente resultado das exitosas experiências no âmbito das concessões públicas, que sofreu alteração neste aspecto em 2005, e de algumas modalidades de licitações.
Também foi instituída a fase de “negociação”, encontrada em modalidades já existentes, como o pregão, com o intuito de buscar a proposta mais vantajosa para a Administração Pública, princípio basilar das contrações públicas. Assim, de acordo com o artigo 26, parágrafo único, da nova Lei, a Administração poderá negociar melhores condições com o primeiro colocado. Caso a proposta apresentada por este supere o orçamento do objeto licitado, a negociação poderá seguir com os demais licitantes, seguindo a ordem de classificação.


Merecem ainda, especial destaque, as influências do direito ambiental e urbanístico na elaboração da Lei em questão. Conforme redação do artigo 4º, parágrafo 1º, as contratações realizadas com base nesse regime diferenciado devem respeitar, especialmente, as normas relativas à disposição final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos, o que se justifica em razão da recente legislação que instituiu a PNRS (Política Nacional de Resíduos Sólidos); mitigação por condicionantes e compensação ambiental, que serão definidas no procedimento de licenciamento ambiental; utilização de produtos, equipamentos e serviços que, comprovadamente, reduzam o consumo de energia e recursos naturais, dentre outras.


Isso se torna especialmente relevante na medida em que a Administração Pública, na busca da maior vantagem, deverá considerar os custos e benefícios, diretos e indiretos, de natureza econômica, social ou ambiental, inclusive os relativos à manutenção, ao desfazimento de bens e resíduos, ao índice de depreciação econômica e a outros fatores de igual relevância. Trata-se, sem dúvida, da positivação de critérios para buscar a “função regulatória da licitação”, como vem denominando parte da doutrina.
A Lei disciplina, ainda, as formas de contratação de obras e serviços de engenharia (artigo 8º), a possibilidade de instituição da polêmica “remuneração variável”, vinculada ao desempenho da contratada - com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega – (artigo 10), os recursos cabíveis e os prazos (artigo 45) e as sanções administrativas (artigo 47). É importante lembrar que as contratações diretas, por dispensa ou inexigibilidade de licitação, devem seguir os parâmetros já estabelecidos na Lei Federal 8.666/93, tanto em relação às hipóteses como aos seus procedimentos.
O RDC foi introduzido com o intuito de permitir maior celeridade e reduzir a burocracia na contratação de obras e serviços necessários à realização dos eventos mundiais que o Brasil sediará a partir de 2013. Os interessados – Poder Público e a iniciativa privada – devem se familiarizar com os instrumentos e procedimentos estabelecidos nessa nova legislação, que indubitavelmente será uma das principais normas aplicáveis ao setor de infraestrutura nos próximos anos e poderá servir de ponto de partida para a aguardada reforma da atual Lei de Licitações.

(www.ultimainstancia.uol.br )

Planos de saúde e tratamento domiciliar

Plano de Saúde deverá fornecer tratamento domiciliar

A 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Ceará determinou na terça-feira (1°/11) que a Unimed de Fortaleza forneça tratamento médico domiciliar à paciente A.R.P., que sofre de doença renal e precisa de sessões semanais de hemodiálise A decisão foi unânime e, de acordo com o relator, desembargador Váldsen da Silva Alves Pereira, entender o contrário seria uma ofensa ao princípio da dignidade humana.
De acordo com os autos, A.R.P é cliente da Unimed desde 1990. Em 2008, migrou para o melhor plano da empresa. Para que seu atendimento não fosse prejudicado com a carência da alteração contratual, pagou uma taxa de R$ 4,2 mil. Em dezembro do mesmo ano, foi internada com quadro de demência e insuficiência renal crônica.
Após quatro meses internada, a idosa teve alta, mas deveria ter atendimento domiciliar e traslado para realização de hemodiálise, conforme prescrição médica. A Unimed não atendeu o pedido e passou a cobrar pelos procedimentos realizados.
A idosa ingressou na Justiça requerendo a permanência no hospital sem custo ou tratamento médico domiciliar. Em abril de 2009, o então juiz da 22ª vara Cível, Emanuel Leite Albuquerque, acatou o pedido e determinou à Unimed manter o tratamento da paciente no hospital ou na residência dela.
Contraria com a decisção, a companhia impetrou agravo de instrumento no TJ-CE requerendo a reforma da decisão. Sustentou que o contrato firmado com a cliente não prevê atendimento domiciliar.
Ao analisar o caso, os membros da 8ª Câmara Cível decidiram, por unanimidade, manter a decisão do primeiro grau. "A reforma de decisão causaria um descompasso com a legislação do consumidor, além de ferir o princípio da dignidade humana, consagrado constitucionalmente, e repetido na Lei dos Planos de Saúde", votou o relator. Com informações da Assessoria de Imprensa do Tribunal de Justiça do Ceará.
Revista Consultor Jurídico, 2 de novembro de 2011

Desconsideração da personalidade jurídica

Desconsideração da personalidade jurídica: proteção com cautela
 
A distinção entre pessoa jurídica e física surgiu para resguardar bens pessoais de empresários e sócios em caso da falência da empresa. Isso permitiu mais segurança em investimentos de grande envergadura e é essencial para a atividade econômica. Porém, em muitos casos, abusa-se dessa proteção para lesar credores. A resposta judicial a esse fato é a desconsideração da personalidade jurídica, que permite superar a separação entre os bens da empresa e dos seus sócios para efeito de determinar obrigações.

A ministra Nancy Andrighi, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), conta que a técnica jurídica surgiu na Inglaterra e chegou ao Brasil no final dos anos 60, especialmente com os trabalhos do jurista e professor Rubens Requião. “Hoje ela é incorporada ao nosso ordenamento jurídico, inicialmente pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC) e no novo Código Civil (CC), e também nas Leis de Infrações à Ordem Econômica (8.884/94) e do Meio Ambiente (9.605/98)”, informou. A ministra adicionou que o STJ é pioneiro na consolidação da jurisprudência sobre o tema.

Um exemplo é o recurso especial (REsp) 693.235, relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão, no qual a desconsideração foi negada. No processo, foi pedida a arrecadação dos bens da massa falida de uma empresa e também dos bens dos sócios da empresa controladora. Entretanto, o ministro Salomão considerou que não houve indícios de fraude, abuso de direito ou confusão patrimonial, requisitos essenciais para superar a personalidade jurídica, segundo o artigo 50 do CC, que segue a chamada “teoria maior”.

Segundo Ana de Oliveira Frazão, advogada, professora da Universidade de Brasília (UnB) e especialista no tema , hoje há duas teorias para aplicação da desconsideração. A maior se baseia no antigo Código Civil e tem exigências maiores. Já na teoria menor, com base na legislação ambiental e da ordem econômica, o dano a ser reparado pode ter sido apenas culposo e se aplica, por exemplo, quando há desvio de finalidade da empresa.

“Acho a teoria menor muito drástica, pois implica a completa negação da personalidade jurídica. Todavia, entendo que pequenos credores, como consumidores, e credores involuntários, como os afetados por danos ambientais, merecem tutela diferenciada”, opina a professora.

Teoria menor

Um exemplo da aplicação da teoria menor em questões ambientais foi o voto do ministro Herman Benjamin no REsp 1.071.741. No caso, houve construção irregular no Parque Estadual de Jacupiranga, no estado de São Paulo. A Segunda Turma do STJ considerou haver responsabilidade solidária do Estado pela falha em fiscalizar.

Entretanto, a execução contra entes estatais seria subsidiária, ou seja, o estado só arcaria com os danos se o responsável pela degradação ecológica não quitasse a obrigação. O ministro relator ponderou que seria legal ação de regresso que usasse a desconsideração caso o responsável pela edificação não apresentasse patrimônio suficiente para reparar o dano ao parque.

Outro julgado exemplar da aplicação da teoria menor foi o REsp 279.273, julgado pela Terceira Turma do STJ. Houve pedido de indenização para as vítimas da explosão do Shopping Osasco Plaza, ocorrida em 1996. Com a alegação de não poder arcar com as reparações e não ter responsabilidade direta, a administradora do centro comercial se negava a pagar.

O relator do recurso, ministro Ari Pargendler, asseverou que, pelo artigo 28 do CDC, a personalidade jurídica pode ser desconsiderada se há abuso de direito e ato ilícito. No caso não houve ilícito, mas o relator afirmou que o mesmo artigo estabelece que a personalidade jurídica também pode ser desconsiderada se esta é um obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.
Cota social
Entre as teses consolidadas na jurisprudência do STJ está a aplicada no REsp 1.169.175, no qual a Terceira Turma, seguindo voto do ministro Massami Uyeda, decidiu que a execução contra sócio de empresa que teve sua personalidade jurídica desconsiderada não pode ser limitada à sua cota social. No caso, um professor sofreu queimaduras de segundo grau nos braços e pernas após explosão em parque aquático.

A empresa foi condenada a pagar indenização de R$ 20 mil, mas a vítima não recebeu. A personalidade da empresa foi desconsiderada e a execução foi redirecionada a um dos sócios. O ministro Uyeda afirmou que, após a desconsideração, não há restrição legal para o montante da execução.

Desconsideração inversa

Pessoas físicas também tentam usar pessoas jurídicas para escapar de suas obrigações. No REsp 948.117, um devedor se valeu de empresa de sua propriedade para evitar execução. Para a relatora, ministra Nancy Andrighi, seria evidente a confusão patrimonial e aplicável a “desconsideração inversa”. A ministra ressalvou que esse tipo de medida é excepcional, exigindo que se atendam os requisitos do artigo 50 do CC.
Empresa controladora
Outro exemplo de aplicação da desconsideração da personalidade foi dado no REsp 1.141.447, relatado pelo ministro Sidnei Beneti, da Terceira Turma do STJ. No caso, desconsiderou-se a personalidade jurídica da empresa controladora para poder penhorar bens de forma a quitar débitos da sua controlada.

O credor não conseguiu encontrar bens penhoráveis da devedora (a empresa controlada), entretanto a empresa controladora teria bens para quitar o débito. Para o ministro Beneti, o fato de os bens da empresa executada terem sido postos em nome de outra, por si só, indicaria malícia, pois estariam sendo desenvolvidas atividades de monta por intermédio de uma empresa com parco patrimônio.

Entretanto, na opinião de vários juristas e magistrados, a desconsideração não pode ser vista como panaceia e pode se tornar uma faca de dois gumes. A professora Ana Frazão opina que, se, por um lado, aumenta a proteção de consumidores, por outro, há o risco de desestimular grandes investimentos. Esse posicionamento é compartilhado por juristas como Alfredo de Assis Gonçalves, advogado e professor aposentado da Universidade Federal do Paraná, que teme já haver uso indiscriminado da desconsideração pelos tribunais.

A ministra Nancy Andrighi, entretanto, acredita que, no geral, os tribunais têm aplicado bem essa técnica. Ela alertou que criminosos buscam constantemente novos artifícios para burlar a legislação. “O que de início pode parecer exagero ou abuso de tribunais na interpretação da lei, logo se mostra uma inovação necessária”, declarou.

Fraudes e limites

A ministra do STJ dá como exemplo um recente processo relatado por ela, o REsp 1.259.018. A principal questão no julgado é a possibilidade da extensão dos efeitos da falência a empresas coligadas para reparar credores. A ministra Nancy apontou que haveria claros sinais de fraude, com transferência de bens entre as pessoas jurídicas coligadas e encerramento das empresas com dívidas. Para a ministra, os claros sinais de conluio para prejudicar os credores autorizaria a desconsideração da personalidade das empresas coligadas e a extensão dos efeitos da falência.

Impor limites ao uso da desconsideração também é preocupação constante de outros magistrados do STJ, como manifestado pelo ministro Massami Uyeda em outro processo. No REsp 1.080.682, a Caixa Econômica Federal, por meio da desconsideração, tentou cancelar a transferência de imóvel para pessoa jurídica em processo de falência.

O bem pertencia ao ex-administrador da empresa falimentar e, segundo a Caixa, seria uma tentativa de mascarar sua verdadeira propriedade. Contudo, o ministro Uyeda apontou que a transferência do imóvel ocorreu mais de um ano antes da tentativa de penhora. Além disso, naquele momento, o proprietário do imóvel não administrava mais a empresa.
 

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Títulos de crédito e a predominância do caráter pro solvendo

Os títulos de crédito têm natureza pro solvendo, eis que entregues para serem saldados ou pagos daí a certo tempo. É pro solvendo o título quando não significa a efetivação do pagamento com a sua simples entrega. Tanto que representa uma quantia em dinheiro, que o credor receberá em momento oportuno. A posse ou propriedade do documento não importa em disposição da cifra que encerra. Ademais, permite a discussão da causa debendi. Mesmo que verificada a prescrição, não se afasta a ação ressarcitória por enriquecimento indevido. Segue Luiz Emygdio F. da Rosa Júnior: "a) Ocorrendo prescrição ou decadência de natureza cambiária, o portador do título tem ação de enriquecimento sem causa em face do devedor, baseado na relação causal que originou o título (Lei do Cheque, art. 62,  e Decreto nº 2.044/1908, art. 48); b) O devedor acionado pelo credor com quem se relaciona diretamente no título pode, em embargos, arguir a relação causal entre eles existentes para não pagar ou pagar a menor o título executado (Decreto nº 2.044/1908, art. 51), e da mesma forma o devedor, quando acionado por terceiro adquirente de má-fé (LUG, art. 17, e Lei do Cheque, art. 25). Disso resulta que, em regra, o título de crédito é emitido com natureza pro solvendo (para pagamento), e, assim, a relação causal só se extingue com o pagamento do título de crédito."
A mera entrega do título não extingue o crédito, Mesmo porque o pagamento se concretiza quando vencer o título, com a entrega da importância lançada em sua face.
O título pro soluto acarreta a extinção da obrigação com a sua transferência ao credor, pois corresponde ao pagamento. Numa escritura pública, assinala-se expressamente a quitação com a simples tradição do título. Reclama-se, para operar esse efeito, de cláusula explícita, o que raramente acontece, dadas as cautelas que se deve ter na interpretação. Acontece que, especialmente na compra e venda, uma vez confreida essa feição, só resta ao comprador executar o título, não lhe assistindo a resolução por inadimplemento.

Arnaldo Rizzardo  in Títulos de Crédito

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Desvirtuamento de estágio gera vínculo empregatício

Professor admitido para ministrar aulas para o projeto Universidade para Todos deve receber os benefícios assegurados em norma coletiva. Esta é a decisão da 6ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, que rejeitou o recurso da Fundação Ceciliano Abel de Almeida (FCAA), do Espírito Santo, que pretendia isentar-se da obrigação. A Turma considerou que houve desvirtuamento do contrato de estágio, resultando na relação de trabalho entre as partes.

O trabalhador, admitido em 2005, ajuizou reclamação trabalhista contra a fundação requerendo a declaração de vínculo empregatício, pagamento de verbas rescisórias e os benefícios previstos em norma coletiva. A FCAA afirmou que proporcionava aplicação prática ao aluno pelo estágio, cumprindo com o objetivo de apoiar o Projeto Universidade para Todos. A instituição declarou, ainda, que firmou um termo de compromisso de estágio e que o autor da ação era matriculado em curso correspondente às suas atividades e com frequência devidamente cumprida.

Na primeira instância, o contrato de estágio foi considerado nulo, sendo reconhecida a existência de relação de emprego. A sentença também destaca que ficou demonstrado que o empregado participou de atividades ligadas ao curso, mas a empresa mantivera a relação de estágio apenas. A condição de professor foi ainda confirmada por testemunhas, de acordo com os autos.

O ministro Aloysio Corrêa da Veiga, relator do processo no TST, considera que a decisão não contraria a Súmula 374, segundo alegou a FCAA. A fundação tentou se desobrigar de honrar benefícios por não participar da celebração da norma coletiva, considerando-se categoria diferenciada. No entanto, segundo o ministro, o acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região, do Espírito Santo, deixa a certeza da finalidade da fundação, de apoio à Universidade Federal do Espírito Santo, que está relacionada a projetos de ensino. Com informações da Assessoria de Imprensa do TST.

(www.conjur.com.br )

domingo, 16 de outubro de 2011

Teoria objetiva ou da declaração

A teoria da declaração constitui, em certo sentido, a antítese da teoria da vontade, ou subjetiva.
Seus partidários aduzem, preliminarmente, que a regra da invalidade da declaração sem vontade não possui o alcance irrestrito que se lhe pretende atribuir, pois comporta inúmeras exceções, tais, entre outras, as seguintes: a) - não se aplica às cláusulas acessórias ou não essenciais dos atos jurídicos; b) - não atua quando a causa da divergência apenas consiste na reserva mental do declarante; c) - nas declarações de vontade destinadas a produzir efeitos entre ausentes, pode o emitente retratar-se, enquanto sua declaração não chegar ao conhecimento do destinatário, mas, se a declaração de retrato não for por este recebida antes ou ao mesmo tempo da declaração inicial, esta prevalecerá sobre aquela, vinculando o declarante. Em todos esses casos e em outros  mais, acrescentam, o declarante, de fato, não quis ou já não quer o que declarou e, no entanto, sua declaração deve prevalecer; e se a aludida regra  possuísse eficácia absoluta, então, dizem ainda os objetivistas, deveríamos também admitir que o erro inexcusável do declarante seria causa de invalidade da declaração, o que, por direito, não se permite.
Assim sendo, afirma-se,  o que é decisivo não é a vontade do autor da declaração, mas aquilo que, a bom direito, como vontade aparece a quem a declaração se dirige.
Mas, nem todos os sequazes dessa teoria a sustentam até suas consequências extremas, pois, em sua mor parte, ora a aplicam só às declarações entre vivos, ora aos contratos bilaterais tão somente.Fundamento principal por todos adotado é o da necessidade de proteção da segurança do comércio jurídico, em atenção à tendência de se equiparar à realidade a aparência que, de boa fé, como realidade se toma. O próprio Windscheid (nota 1ª ao § 75 de suas Pandectas) já reconhecia que 'essa tendência se afirmou, energicamente, no mundo moderno', acrescentando, porém, que semelhante argumento (quando mesmo razões outras não existissem, contrárias à tese do caráter decisivo da declaração), argumento seria de lege ferenda e não de lege data. O mesmo autor esclarece que não logrou acolhida a tese de Leonhard segundo a qual, nas fontes, o consensus designa o acordo de declarações e não o acordo de vontades.
Por mais respeitável que se afigure o propósito de imprimir segurança às relações disciplinadas pelo direito, nem por isso poder-se-á desconhecer a função fundamental dos elementos volitivos na formação e na eficácia dos atos jurídicos, mesmo que se reduza o campo de aplicação dessa teoria aos atos inter vivos, ou tão só, aos contratos bilaterais, admitindo-se, ainda apenas dentro destes limites, como regra, o predomínio da declaração sobre a vontade, em caso de conflito.

(Ato Jurídico - Vicente Ráo)

Ihering e a posse

Segundo Ihering a posse é a exteriorização ou visibilidade do domínio, ou seja, a relação exterior intencional existente normalmente entre a pessoa e a coisa, tendo em vista a função econômica desta. O importante é o uso econômico ou destinação econômica do bem, pois qualquer pessoa é capaz de reconhecer a posse pela forma econômica de sua relação exterior com a pessoa. Por exemplo, se virmos alguns materiais junto a uma construção, apesar de ali não se encontrar o possuidor, exercendo poder sobre a coisa, a circunstância das obras e dos materiais indica a existência da posse de alguém.
São elementos constitutivos da posse : a) o corpus, exterioridade da propriedade, que consiste no estado normal das coisas, sob o qual desempenham a função econômica de servir e pelo qual o homem distingue quem possui e que não possui; e b) animus ou affectio tenendi, que já está incluído no corpus, indicando o modo como o proprietário age em face do bem de que é possuidor. Com isso o corpus é o único elemento visível e suscetível de comprovação, estando vinculado ao animus, do qual é manifestação externa. A dispensa da intenção de dono na caracterização da posse permite considerar como possuidores, além do proprietário, o locatário, o comodatário, o depositário etc.
O possuidor é o que tem o pleno exercício de fato dos poderes constitutivos do domínio ou somente de alguns deles, como no caso dos direitos reais sobre a coisa alheia, como o usufruto, a servidão etc.
O Conselho da Justiça Federal, na III Jornada de Direito Civil, interpretando os arts. 1.196, 1.205 e 1.212 do novo Código Civil, entendeu, no Enunciado n. 236: 'Considera-se possuidor, para todos os efeitos legais, também a coletividade desprovida de personalidade jurídica.'

(Comentários ao art. 1.196 - Código Civil Anotado - Maria Helena Diniz - 14ª edição - Editora Saraiva )

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Nova lei das cautelares e o CPP. A quem interessa a Lei 12.403/11?

Nova Lei das Cautelares só interessa aos criminosos
Foi publicada no Diário Oficial da União do dia 5 de maio de 2011 a Lei 12.403/11. Alterou dispositivos da Lei Processual Penal, relativos à prisão processual, à fiança, à liberdade provisória e demais medidas cautelares.
A referida lei modificou diversos artigos do Código de Processo Penal, revogando outros, trazendo modificações significativas no tratamento da prisão cautelar, as quais ocasionaram forte impacto no controle da criminalidade, fazendo subir, em poucos dias, assustadoramente, a quantidade de crimes que assola a população brasileira.
Isso porque, a par de todas as iniciativas legislativas e governamentais já existentes para evitar a prisão do criminoso definitivamente condenado, que nunca cumpre a sua pena na integralidade e sempre se beneficia de inúmeros benefícios legais para continuar solto ou ganhar a liberdade em curtíssimo espaço de tempo, a nova lei praticamente proibiu que uma pessoa acusada de crime aguarde presa o desfecho do processo.
Em termos de custódia processual – prisão sem pena, a prisão preventiva, é a que mais se aproxima da ideia de prisão cautelar, sendo necessários, para sua decretação, dois requisitos já bastante conhecidos: fumus delicti comissi e periculum libertatis. A fumaça do bom Direito vem consubstanciada na prova da existência do crime e nos indícios suficientes de autoria. O perigo na demora, de seu turno, demanda um dos seguintes fatores: garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, conveniência da instrução criminal e segurança na aplicação da lei penal.
Entretanto, mesmo presentes esses requisitos legais, fazendo-se necessária, até mesmo imprescindível, a custódia cautelar do acusado, a Lei nº 12.403/11 apenas permitiu a decretação da prisão preventiva em crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos.
A bem da verdade, há que se mencionar outras poucas hipóteses de decretação de prisão preventiva admitidas pela lei, como os casos de reincidência em crime doloso e crimes envolvendo violência doméstica e familiar.
Mas, e nos demais casos? E nos casos de crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade de até quatro anos, em que haja real necessidade de decretação da custódia cautelar?
Nesses casos, a lei autoriza apenas a aplicação de pífias medidas cautelares, arroladas no artigo 319 do Código de Processo Penal. São eles o comparecimento periódico em juízo (que a prática já demonstrou ser inviável, pois o acusado não a cumpre), proibição de manter contato com determinada pessoa (que o acusado também raramente cumpre, até porque inexiste qualquer tipo de fiscalização), proibição de ausentar-se da comarca – ou do país –, entre outros. Basta lembrarmos recentes casos de criminosos notórios, condenados a penas muito altas, que, a pretexto de serem inocentes até o trânsito em julgado de sentença condenatória, obtiveram o direito de permanecer em liberdade e fugiram imediatamente do país.
Seguem-se: recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga (medida risível, considerando a ausência de fiscalização e controle), monitoração eletrônica (que vem apresentando sérios problemas de fiscalização nas hipóteses em que já foi anteriormente aplicada, como nos casos de saídas temporárias de presos, que não retornaram ao sistema prisional), dentre outras. Isso sem contar que as referidas medidas cautelares alternativas à prisão podem ser aplicadas em qualquer caso, inclusive em crimes graves e hediondos, desde que o juiz entenda não ser o caso de prisão preventiva,concedendo ao acusado a liberdade provisória.
Figura, ainda, como grande novidade trazida pela nova lei a prisão domiciliar, tratada nos artigos 317 e 318 do Código de Processo Penal, consistente no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial.
Fica a pergunta: quem irá fiscalizar essa prisão domiciliar? Como será feita essa fiscalização? Até o momento não se tem conhecimento de nenhuma medida viável de obrigatoriedade de cumprimento dessa medida pelo acusado.
Inegavelmente, o intuito das novas disposições relativas às medidas cautelares é reduzir e, até mesmo, evitar a prisão processual, seja substituindo a prisão em flagrante por medida cautelar, seja evitando a decretação de prisão preventiva no curso da instrução.
Engana-se quem pensa, como os garantistas de ocasião, que surfam na onda do politicamente correto, que a intenção do legislador – que inegavelmente atuou de acordo com os interesses do poder público – foi instituir um sistema mais justo para evitar a antecipação da condenação, permitindo ao supostamente inocente aguardar o desfecho de seu processo em liberdade, evitando uma injustiça. A intenção do legislador, acossado pelas pretensões estatais, foi a de diminuir a pressão no sistema prisional sem gastos financeiros e investimentos, optando pela solução mais simplista e contrária ao interesse público: soltar o preso.
Sim, porque desde a entrada em vigor da referida lei antiprisão, milhares de detentos ganharam as ruas. A maioria deles retornando ou permanecendo na vida do crime e vitimando a parcela honesta da população brasileira, que não tolera mais tanto descaso do poder público com a segurança, com o sistema prisional, com a polícia, com a Justiça, e clama por um Direito Penal máximo, garantista da sociedade.
Fica, então, a pergunta que reproduz o título deste breve artigo: a quem interessa a Lei 12.403/11? Uma certeza eu tenho: à sociedade brasileira é que não é!

Ricardo Antonio Andreucci é procurador de Justiça Criminal do MP de São Paulo, doutor e mestre em Direito e coordenador pedagógico do Complexo de Ensino Andreucci. É também professor da Escola Superior do Ministério Público – SP e da Escola Superior de Advocacia (ESA)