terça-feira, 27 de novembro de 2012

Ação Monitória

O procedimento monitório foi pensado como alternativa para uma maior tempestividade do processo, podendo ser usado por quem tem prova escrita, sem eficácia executiva, do seu crédito, e pretende obter soma em dinheiro, coisa fungível ou determinado bem móvel. Diante da petição inicial devidamente acompanhada com a prova escrita, o juiz deve mandar expedir o mandado de pagamento ou de entrega de coisa, o juiz deve mandar expedir omandado de pagamento ou de entrega de coisa. O devedor, no prazo de 15 (quinze) dias, poderá cumprir o mandado - caso em que ficará isento do pagamento de custas e honorários de advogado -, restar inerte ou apresentar embargos ao mandado. Não apresentados ou rejeitados os embargos, o título executivo é constituído.

O legislador infraconstitucional concebe o procedimento monitório como técnica destinada a propiciar a aceleração da realização dos direitos e assim como instrumento capaz de evitar o custo inerente à demora do procedimento comum. Partindo da premissa de que um direito evidenciado mediante prova escrita em regra não deve sofrer contestação, o procedimento monitório objetiva, através da inversão do ônus de instaurar a discussão a respeito da existência ou inexistência do direito, desestimular as defesas infundadas e permitir a tutela do direito sem as delongas do procedimento comum.

O procedimento monitório pode ser utilizado por aquele que objetiva soma em dinheiro, coisa fungível ou determinado bem móvel. Isso quer dizer que o proceidmento está à disposição de quem pretende soma em dinheiro, coisa incerta - isto é, coisa determinada pelo gênero e pela qualidade - ou coisa móvel (coisa certa). O procedimetno monitório não cabe para impor a alguém um fazer, um não fazer e a entrega de coisa infungível. Também não cabe para tutela do direito à coisa imóvel.

"É cabível ação monitória contra a Fazenda Pública." (Súmula 339, STJ)

O art. 1102-A, CPC, quando faz referência à prova suficiente para fundamentar a ação monitória, fala apenas em prova escrita sem eficácia de título executivo. O objetivo do legislador é evitar o surgimento de uma discussão atinente ao interesse de agir do titular de título executivo na propositura da ação monitória. Em face desta norma, não ha dúvida que o credor que pode se valer da ação executiva está impedido de propor ação monitória.

(Trecho extraído do CPC Comentado artigo por artigo - Marinoni & Mitidiero - Editora RT) 

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Tolerância do antigo dono não assegura acesso público a cachoeira após venda do imóvel

 
A servidão de passagem, por constituir forma de limitação do direito de propriedade, não se presume e deve ser interpretada restritivamente. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) restabeleceu sentença de primeiro grau que julgou improcedentes os pedidos de chacareiros que pretendiam usufruir de cachoeira localizada em propriedade privada.

Donos de chácaras do denominado “Recanto das Cachoeiras”, que fica na estância ecológica do município de Juquitiba (SP), moveram ação contra o atual proprietário de uma das unidades do complexo – onde há uma cachoeira, um riacho e parte de uma estrada aberta para acesso à cachoeira.

Com a ação, eles pretendiam a liberação da área, que abrange a cachoeira, para uso comum. Até a data da venda da propriedade, os autores utilizavam livremente o espaço para banho e lazer.

Uso comum

Os autores sustentaram na ação que as chácaras fazem parte de um conjunto, contando com áreas de lazer, churrasqueiras, trilhas, lagos e quiosques, “num verdadeiro bosque de uso comum de todos, conforme trato verbal do representante da mandatária do proprietário, por ocasião das aquisições daquelas unidades”.

Alegaram que o novo proprietário de uma das chácaras havia fechado toda a extensão da cachoeira com balaústres de concreto armado e fios de arame farpado, impedindo, segundo eles, a passagem que leva à cachoeira.

Requereram a concessão de liminar para “a imediata desobstrução do acesso, mantendo-se assim a servidão de passagem existente, com a consequente utilização da área de lazer”. No mérito, pediram a manutenção da servidão de passagem e a condenação do vizinho por perdas e danos.

O juízo de primeiro grau julgou o pedido improcedente, dando razão ao dono da área privada. Para o magistrado, havia comprovação de que os autores tiveram acesso ao local por mera liberalidade ou tolerância do antigo proprietário.

Escoteiros
Na apelação, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) deu provimento ao recurso, fundamentando que havia prova técnica de que, até ter sido cercada, a cachoeira era de uso comum, servindo de lazer para todos os condôminos e, ainda, para grupos de escoteiros.

Diante desse julgamento, o proprietário da área recorreu ao STJ, sustentando que a decisão de segundo grau promoveu “verdadeira desapropriação por interesse público, instituindo dentro da propriedade particular uma área pública de lazer”.

Alegou que a servidão só pode ser estabelecida com registro imobiliário de seu ato constitutivo, não sendo presumida. Além disso, em seu entendimento, a decisão do tribunal deu permissão para que pessoas indeterminadas frequentem o local privado, para fins de lazer.

Ao analisar o caso, o ministro Villas Bôas Cueva, relator do recurso especial, explicou que a servidão de passagem, também denominada servidão de trânsito, “constitui espécie do gênero servidão predial e, como toda servidão, é um direito real, constituindo uma restrição voluntária ao direito de propriedade”.

Além disso, “destina-se a servir de passagem para outro imóvel distinto dotado de utilidade para o prédio dominante ou para a via pública”.

O relator explicou ainda que, de acordo com o artigo 696 do Código Civil, a servidão não se presume, mas pode ser constituída por ato voluntário das partes interessadas em sua instituição. Para tanto, é necessário o registro no cartório.

Necessidade de trânsito

Entre outros fatos apurados no processo pelas instâncias ordinárias, o ministro anotou que a área da cachoeira não foi vendida pelo loteador, durante alguns anos. No entanto, diante de necessidades financeiras, ele decidiu vender a área e, inicialmente, ofereceu-a aos proprietários das demais chácaras, os quais não se interessaram.

Assim, a venda foi feita a terceiro, que decidiu fechar o acesso à cachoeira. Também ficou demonstrado que a área em discussão não foi gravada oficialmente como de uso comum.

Villas Bôas Cueva ressaltou que a servidão de passagem existe em função da necessidade/utilidade de trânsito, de acesso. Analisando o caso, concluiu que os autores da ação não pretendem assegurar saída à via pública ou acesso a bem de uso comum.

“Buscam, isso sim, o direito de permanecer na fruição de bem particular alienado a terceira pessoa, cujo gozo lhes foi permitido por tolerância do antigo proprietário mediante trato verbal com o seu representante, por ocasião da aquisição das suas glebas”, afirmou o ministro.

Para o relator, acolher a tese do TJSP, segundo a qual só não haveria servidão de passagem se o local de destino, público ou privado, não tivesse nenhuma serventia, significaria interpretar o instituto de forma equivocada, indo de encontro aos preceitos legais e às recomendações doutrinárias.
(www.stj.gov.br )

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Estabilidade de servidor público não é garantia de impunidade


A estabilidade no emprego é o sonho de milhares de trabalhadores que batalham por uma vaga no serviço público. A garantia protege o servidor de pressões hierárquicas e políticas. Resguarda também a própria administração, assegurando a continuidade dos serviços.

As críticas à estabilidade funcional são inúmeras. Muitos acreditam que ela favorece a baixa qualidade do serviço público, uma vez que o servidor estável não teria compromisso com produtividade e eficiência. Contudo, a própria legislação traz uma série de deveres e proibições que, se não observados, geram punição. Da simples advertência à demissão, tudo depende da natureza e da gravidade da infração, do dano causado, das circunstâncias e dos antecedentes funcionais.

Em 2011, a administração pública federal aplicou 564 punições administrativas expulsivas do serviço público. Foram 469 demissões, 38 cassações de aposentadoria e 57 destituições. Até setembro de 2012, foram mais 394 expulsões. Desde 2003, quando a Controladoria Geral da União (CGU) começou a registrar os dados, foram aplicadas 3.927 penalidades máximas.

De acordo com o relatório da CGU, entre 2003 e 2011, quase 32% das punições foram aplicadas por uso indevido do cargo público e 19% por improbidade administrativa. Abandono de cargo (falta injustificada por mais de 30 dias consecutivos) motivou 8,6% das expulsões, seguido de recebimento de propina (5,5%) e desídia (4,8%), que é desleixo, negligência ou descaso com o trabalho. Os outros 30% saíram por motivos variados, como acumulação ilegal de cargos, aplicação irregular de dinheiro público e dilapidação de patrimônio.

Legislação
O artigo 41 da Constituição Federal (CF) estabelece que o servidor é estável após três anos de exercício no cargo. A partir daí, só pode perder o emprego em três hipóteses: por decisão judicial transitada em julgado, após processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa e mediante procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa.

A Lei 8.112/90 – Estatuto do Servidor – traz no artigo 116 os deveres dos servidores públicos, e no artigo 117 lista as proibições. As penalidades, no artigo 127, são seis: advertência, suspensão, demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade, destituição de cargo em comissão e de função comissionada. Já o artigo 132 estabelece os casos em que deve ser aplicada a pena de demissão.

O servidor que descumprir seus deveres ou violar as proibições pode ser punido administrativamente, por meio de Processo Administrativo Disciplinar (PAD). Geralmente, quem é punido nessa esfera recorre ao Judiciário, principalmente quando aplicadas as penas mais graves, que são demissão e cassação de aposentadoria ou disponibilidade.

Na administração federal, as demissões são efetivadas com a publicação de portaria assinada pelo ministro de estado ao qual está subordinado o órgão do servidor. O ato do ministro é contestado no STJ por meio de mandado de segurança. A competência para julgar esses processos é atualmente da Primeira Seção, especializada em direito público.

Até abril de 2010, tais casos competiam à Terceira Seção, especializada em matéria penal, que também julgavam questões relativas a servidores públicos. Para conter a sobrecarga de processos no colegiado penal, o regimento interno foi alterado, mas a Terceira Seção permaneceu com os casos que já haviam sido distribuídos antes da mudança.

Só este ano, o STJ julgou quase cem processos de servidores contra demissões aplicadas pela administração. Confira as principais decisões.

Demissão obrigatória
A Primeira Seção consolidou o entendimento de que "a administração pública, quando se depara com situações em que a conduta do investigado se amolda às hipóteses de demissão ou cassação de aposentadoria, não dispõe de discricionariedade para aplicar pena menos gravosa por se tratar de ato vinculado" – ou seja, é obrigada a demitir.

Com base nessa tese, a Seção manteve a demissão de agentes administrativos do Ministério da Fazenda. Eles permitiram o pagamento irregular de valores retroativos a aposentados em processos fraudulentos, inclusive com falsificação de assinaturas e de portarias.

Eles alegaram falta de proporcionalidade e razoabilidade na punição, e inexistência de prejuízo ao erário. Para a maioria dos ministros, o prejuízo é evidente, porque os valores indevidos foram pagos e não retornaram aos cofres públicos. Entenderam que ficou comprovada a gravidade das condutas apuradas e que a pena de demissão foi adequadamente aplicada.

Nesse caso, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho ficou vencido. Ele concedia a segurança para reintegração dos demitidos, permitindo a aplicação de pena menos severa. O ministro considerou que os servidores tinham mais de 34 anos de serviço público sem punição administrativa anterior (MS 12.200).

Improbidade administrativa

A Primeira Seção decidiu que é possível condenar servidor à cassação de aposentadoria em PAD por fato previsto na Lei de Improbidade Administrativa (LIA – Lei 8.429/92). Para a maioria dos ministros, não há incompatibilidade entre o artigo 20 da LIA e os artigos 127 e 132 da Lei 8.112.

Com esse entendimento, a Seção manteve a cassação de aposentadoria de ex-auditor fiscal da Receita Federal, condenado em PAD por deixar de lançar tributos em benefício de diversas empresas. Incialmente, a comissão impôs a pena de demissão do servidor.

Como ele aposentou-se antes da conclusão do PAD, houve retificação do ato para cassar a aposentadoria. De acordo com o artigo 134 da Lei 8.112, “será cassada a aposentadoria ou a disponibilidade do inativo que houver praticado, na atividade, falta punível com a demissão”.

O ministro Herman Benjamin, relator do caso, destacou que o artigo 132, inciso IV, do Estatuto do Servidor prevê a pena de demissão para servidores que tenham incidido em improbidade administrativa. “A redação é anterior à atual Lei 8.429, mas está distante de significar ausência de tipicidade da conduta”, afirmou no voto.

Segundo Benjamin, da interpretação sistemática do artigo 20 da LIA, combinado com os artigos 37 e 41 da Constituição e a Lei 8.112, conclui-se que não foi abolido nenhum dispositivo legal que estabeleça pena de demissão. “É inconcebível que uma lei redigida para coibir com maior rigor a improbidade administrativa no nosso país tenha terminado por enfraquecer sua perquirição”, analisou.

“O artigo 20 não está dizendo que é só por sentença transitada em julgado que se pode demitir. O que ele está dizendo é que a pena de demissão imposta numa ação de improbidade só se efetiva depois do trânsito em julgado”, complementou o ministro Teori Zavascki (MS 16.418).

Pena mais grave
O servidor público pode sofrer pena ainda mais grave do que a sugerida por comissão disciplinar. A Terceira Seção manteve pena de demissão a ex-servidor da Previdência Social, apesar de a comissão de processo disciplinar ter sugerido a aplicação de 90 dias de suspensão. Seguindo voto do relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, a Seção reconheceu que a imposição da pena mais grave pelo ministro de estado foi fundamentada na existência de dolo por parte do ex-servidor e na gravidade da infração.

No caso, um técnico do seguro social foi apontado em operação da Polícia Federal como envolvido em irregularidades na concessão de benefícios previdenciários. A comissão disciplinar concluiu pela responsabilidade do servidor e sugeriu a pena se suspensão. No entanto, a Consultoria Jurídica do Ministério da Previdência Social concluiu que deveria ser aplicada a pena de demissão.

Ao analisar mandado de segurança do ex-servidor, o ministro Bellizze constatou que o ministro de estado nada mais fez do que aplicar a previsão contida no artigo 168 da Lei 8.112, segundo o qual, “quando o relatório da comissão contrariar as provas dos autos, a autoridade julgadora poderá, motivadamente, agravar a penalidade proposta, abrandá-la ou isentar o servidor de responsabilidade” (MS 14.856).

Punição cumprida e depois agravada

Em outro caso, um analista ambiental contestou sua demissão após o cumprimento de punição imposta anteriormente pelo mesmo fato. O PAD que apurou a prática de concessões irregulares de licenças e autorizações ambientais aplicou suspensão de 75 dias, depois convertida em multa. Após o pagamento, a CGU entendeu que era caso de demissão e determinou a substituição da pena.

Nessas situações, a Terceira Seção entende que, após o encerramento do PAD, não é possível agravar a penalidade imposta, mesmo que a sanção aplicada não esteja em conformidade com a lei ou norma interna. Essa posição tem amparo na Súmula 19 do Supremo Tribunal Federal (STF), que não admite segunda punição de servidor público, decorrente do mesmo processo em que se baseou a primeira.

Além disso, o STJ entende que o PAD só pode ser anulado quando for constatada a ocorrência de vício insanável, ou revisto quando apresentados fatos novos ou circunstâncias posteriores que justifiquem a inocência do servidor punido ou a inadequação da penalidade, que não pode ser agravada. Assim, o analista ambiental foi reconduzido ao cargo (MS 10.950).

PAD contra ex-servidor

A administração pública é obrigada a apurar, por meio de sindicância ou PAD, a responsabilidade civil-administrativa de servidor resultante de sua atuação no exercício do cargo. Caso não o faça, a autoridade competente comete o crime de “condescendência criminosa”, tipificado no artigo 320 do Código Penal.

Com base nessa regra, a Terceira Seção entende que a necessidade de apuração de irregularidades não exclui ex-servidor, que pode ser investigado administrativamente por condutas praticadas quando exerceu o cargo público. Embora não seja mais possível aplicar pena administrativa, a apuração pode ter outros desdobramentos, como remessa de relatório ao Ministério Público para eventual propositura de ação penal ou ação de reparação de danos civis, por exemplo.

Por essa razão, a Seção manteve um PAD instaurado em 2008 contra um procurador federal demitido em 2002. Ele alegou que, sendo ex-servidor, não poderia ser alvo de investigação administrativa. Mas o argumento foi rejeitado (MS 13.916).

Imparcialidade

O servidor que responde a um PAD tem a garantia de imparcialidade dos integrantes da comissão processante. Outro servidor que realizou a sindicância para apurar os fatos ilícitos e emitiu juízo sobre a possível responsabilidade do investigado não pode determinar a instauração do processo e aprovar seu relatório final.

Com esse entendimento, a Terceira Seção anulou, desde sua instauração, um PAD que havia concluído pela demissão de auditor fiscal da Receita Federal. Os ministros não aceitaram que o mesmo servidor destacado para realização da sindicância tivesse instaurado o processo, designado a comissão e aprovado seu relatório final.

Os ministros consideraram que a instauração do PAD envolve, ainda que em caráter preliminar, juízo de admissibilidade, em que é verificada a existência de indícios suficientes da ocorrência de transgressão funcional. Por isso, a legislação traz diversos dispositivos que rejeitam a participação de quem está pessoalmente envolvido nos fatos, comprometendo a imparcialidade da atuação administrativa (MS 15.107).

Proporcionalidade da pena

Uma juíza instaurou processo disciplinar contra um escrivão devido ao arquivamento irregular de 48 cartas precatórias, ocorrido em 1991. A publicação da portaria que o demitiu foi publicada mais de dez anos após o ato de suposta desídia.

Como o crime cometido era de prevaricação, com pena de um ano de detenção, a Segunda Turma entendeu que a pretensão punitiva já estava prescrita. Segundo o artigo 109, inciso V, do Código Penal, ocorre a prescrição da pretensão punitiva em quatro anos quando a pena máxima for de um ano ou, sendo superior, não excede a dois anos.

Além disso, os ministros consideraram “anormal e inadequada” a penalidade de demissão imposta a um servidor com 35 anos de serviços prestados. Conforme o apurado, ele teria deixado de praticar ato de ofício em 1991, consistente em não providenciar os atos que lhe competiam por dever nas respectivas precatórias, só para evitar gastos como despesas de correio. Essa conduta não está entre as hipóteses para as quais a lei prevê a pena de demissão (RMS 27.632).
 

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Procedimento possessório e tutela possessória

Há que se fazer a distinção entre procedimento possessório e tutela possessória para se deixar claro que a circunstância de a ação ser proposta dentro de ano e dia nada tem a ver com a tutela possessória e com a discussão da posse. A ação, seja ou não proposta dentro de ano e dia, sempre será fundada no fato jurídico posse e almejará a tutela possessória. Como é evidente, o direito à tutela possessória não perde o seu conteúdo pelo fato de ter passado o prazo de ano e dia. O que varia, conforme tenha ou não passado ano e dia, é o procedimento, ou melhor, são as técnicas processuais cabíveis para tutela do direito à posse. Atualmente, o que varia é apenas o emprego da técnica antecipatória, que, quando passado ano e dia, exige, além dos requisitos do art. 927, CPC, a demonstração de uma situação de urgência.
 
(CPC comentado, artigo por artigo - Marinoni e Mitidiero - Editora RT)

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Reintegração de Posse. Manutenção de Posse. Interdito Proibitório

A distinção entre a ação de reintegração e a ação de manutenção tem íntima relação com a intensidade  da agressão à posse. Para que alguém possa pedir reintegração, deve ter ocorrido a perda da posse - chamada esbulho; para que se possa exigir manutenção, basta o incômodo no exercício da posse - chamado de turbação (art. 926, CPC). Contudo, a questão não é tão simples assim. É preciso saber quando há efetivamente perda da posse. De acordo com o art. 1.224 do CC, "só se considera perdida a posse para quem não presenciou o esbulho, quando, tendo notícia dele, se abstém de retornar a coisa, ou, tentando recuperá-la, é violentamente repelido." Os atos clandestinos, praticados na ausência do possuidor, não são suficientes para a perda da posse. A coisa somente se considera perdida quando o ausente, tendo notícia  da agressão, abstém-se de retomar a coisa ou, tentando recuperá-la, é violentamente repelido. A agressão praticada na ausência do possuidor não leva à perda da posse; o que conduz à sua perda é o abandono ou mesmo a violência impeditiva de sua recuperação. O interdito proibitório, por sua vez, é conferido àquele que, temendo o esbulho ou a turbação iminentes, objetiva impedir agressão à sua posse (art. 932, CPC). Para o cabimento do interdito possessório, o autor deve provar a probabilidade de iminente agressão à posse. Trata-se de ação nitidamente preventiva. Daí não ser de impressionar o fato de já ter sido confundida com ação cautelar, nada obstante a sua evidente autonomia, pois o possuidor, por meio dela, deseja apenas prevenção. Nela não há referibilidade. Essa ação preventiva viabiliza tutela antecipatória e sentença que podem ordenar, sob pena de multa, decisões mandamentais. Ela somente foi confundida com a cautelar pelo fato de conter técnicas processuais (técnica antecipatória e sentença mandamental) que não estavam presentes no processo de conhecimento clássico. Atualmente, diante da percepção da importância da tutela preventiva dos direitos, e nessa linha da necessidade, de o processo estar munido de técnicas processuais idôneas para viabilizá-la, não há mais como confundir interdito proibitório com ação cautelar. Diante das técnicas processuais contidas no art. 461, CPC, que abriram as portas para uma ação preventiva autônoma - a ação que visa à obtenção de tutela inibitória -, o interdito proibitório pode ser compreendido de maneira mais adequada, pois nada mais é do que um procedimento instituído para dar tutela preventiva à posse.
 
(Código de Processo Civil comentado artigo por artigo - Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero - Editora RT - 2ª Edição revista, atualizada e ampliada) 

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Habeas corpus: remédio constitucional ou panaceia universal?

 
Instituto secular, o habeas corpus (HC) tutela o direito talvez mais essencial ao homem: sua liberdade física. Pelo menos, é assim que foi concebido. Ao longo do tempo, esse remédio constitucional teve aplicação alargada, chegando a cuidar, com ampla flexibilidade procedimental, de ilegalidades que nem remotamente afetam a liberdade. Mas, como dizia Paracelso há 500 anos, a dose diferencia o remédio do veneno. E o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendido que é hora de corrigir rumos. Confira nesta reportagem.

Na biblioteca do Tribunal, há referências a decisões nacionais datadas de 1834 sobre o instituto. Desde então, o alcance de seu cabimento foi progressivamente ampliado. Mais recentemente, porém, tanto o STJ quanto o Supremo Tribunal Federal (STF) voltaram a restringir sua aplicação, de modo a restabelecer eficiência e racionalidade ao sistema.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), em ofício encaminhado ao STF, lamentou a nova interpretação. Conforme o documento, reproduzido pela imprensa, a OAB entende que a limitação ao alcance do “instituto tão valioso e caro às liberdades individuais e à cidadania, que acaba por reduzir o princípio constitucional da presunção de inocência”, despreza “o procedimento de raízes históricas até então adotado pela corte”.

Redemocratização

Para o ministro Marco Aurélio Bellizze, a extensão que a jurisprudência reconheceu ao habeas corpus após a Constituição de 1988 deve-se a um reflexo do período de exceção que a antecedeu. “Na intenção de proteger o cidadão, foi ampliando, aos poucos, o cabimento do habeas corpus, a fim de salvaguardar direitos que apenas indiretamente poderiam refletir na liberdade de locomoção”, ponderou o relator no HC 216.882.

Segundo Bellizze, o habeas corpus passou progressivamente a tutelar hipóteses sem qualquer risco de prisão, como a simples instauração de inquérito policial. Conforme o ministro, ele “tornou-se o remédio constitucional adequado para atacar, a qualquer tempo, todos os atos da persecução criminal”.

Do número 2...

Já no Habeas Corpus 2, julgado pelo STJ em 14 de junho de 1989, essa ampliação era destacada. O HC foi conhecido como substitutivo de “recurso necessário”, mas negado. O ministro Cid Flaquer Scartezzini apontava que a nova Constituição, diferentemente da anterior, instituída pela emenda de 1969, não impedia de forma expressa o conhecimento do habeas corpus originário em substituição ao recurso devido.

O relator justificava o conhecimento não pela finalidade do HC, que seria a proteção à liberdade, mas por sua agilidade. “O que o distingue é a prontidão e celeridade com que pode restituir a liberdade àquele que é vítima do referido constrangimento ilegal”, afirmou.

...ao 260.000
O STJ se aproxima em 2012, passados 24 anos de sua criação, do HC de número 260 mil. Em 2011, eram 200 mil. “A questão preocupante está no fato de que metade das ações chegou à Corte Superior nos últimos três anos”, avalia o ministro Bellizze, referindo-se ainda aos dados do ano passado.

Só em 2012, até setembro, foram mais de 25 mil novos HCs pedidos, quase três mil só nesse último mês. Nas três primeiras semanas de outubro, já são mais de duas mil autuações de HCs. É quase o mesmo número de Recursos em Habeas Corpus (RHCs) registrado em 2012: 2.380 recursos.

Para Bellizze, a banalização do HC como meio de impugnação ordinária, mesmo sem quaisquer riscos concretos e imediatos ao direito de ir, vir e ficar, inviabiliza a proteção judicial efetiva desses mesmos direitos. Dessa forma, avalia o ministro, levando os processos em que essa tutela se faça realmente necessária a ter uma duração indefinida. Segundo ele, essa situação compromete de modo decisivo a dignidade humana.

“As vias recursais ordinárias passaram a ser atravessadas por incontáveis possibilidades de dedução de insurgências pela impetração do writ [a ordem de habeas corpus], cujas origens me parece terem sido esquecidas, sobrecarregando os tribunais, desvirtuando a racionalidade do ordenamento jurídico e a funcionalidade do sistema recursal”, afirma Bellizze.

Origens lembradas

Em 1900, Marcellino Coelho definia assim, com surpreendente atualidade, o instituto: “[O habeas corpus] não é um recurso no estrito sentido judiciário, empregado como meio de reformar decisão pronunciada. É um novo processo, de ordem jurídica, de natureza sumária, diverso do ato que o originou. É um recurso extraordinário a uma violência dada, na falta de outro que a faça desaparecer, ou a evite.”

O autor da obra Do Habeas Corpus explica, usando decisão tomada pela Suprema Corte dos Estados Unidos, em 1883, a diferença entre a decisão de habeas corpus, que diz respeito apenas ao direito à liberdade do indivíduo, e as matérias de fundo: sua absolvição ou condenação, ou ainda o efetivo ilícito civil, administrativo ou político supostamente cometido.

Segundo Coelho, não haveria qualquer confusão entre o direito a liberdade tutelado no habeas corpus e a culpa ou inocência do réu, cuja avaliação compete a processo completamente diverso.

De homine libero exhibendo

Muito antes, em Roma, o instituto já existia sob diversas formas. Uma delas, o interdictum de homine libero exhibendo, exigia daquele que supostamente detinha como escravo um homem livre que o apresentasse a uma corte.

Segundo o Encyclopedic Dictionary of Roman Law, de modo similar ao expresso por Coelho, a medida servia apenas para avaliar o estado de liberdade da pessoa detida: se era escravo ou homem livre. Sendo considerado o segundo, não poderia ser mantido por seu detentor, mesmo que ele próprio desejasse permanecer detido por conta de uma obrigação qualquer.

Habeas corpus
O termo habeas corpus nasceu na Inglaterra. Era uma ordem dirigida ao xerife mandando que levasse a pessoa determinada a certo lugar em certa hora. Conforme Coelho, o habeas é uma instituição inglesa, consagrada na Magna Carta daquele país de 1215. Porém, somente em 1679, a previsão constitucional inglesa foi regulada em lei, estabelecendo sua aplicação mesmo contra ordens de prisão emitidas pelo rei.

O instituto foi posteriormente adaptado por americanos, argentinos e brasileiros. Mas, já em 1900, sua extensão era polêmica. “O nosso objetivo é provar que devemos aceitar a instituição como ela é, em seus desenvolvimentos, e não trucidá-la ou enxertá-la com teorias e jurisprudência esdrúxula”, afirmava o autor.

Recurso, ação e liberdades
O mesmo texto discutia, inclusive, o caráter recursal ou originário do habeas corpus diante do Supremo, não só do brasileiro, mas também do americano. Discutia também o alcance da tutela, se das liberdades civis mais amplas, ou apenas à de ir e vir. As discussões atravessaram as décadas e alcançaram a jurisprudência atual das cortes superiores.

Em 1900, o debate era em torno da expressão constitucional “dar-se-á o habeas corpus, sempre que o indivíduo sofrer ou se achar em iminente perigo de sofrer violência ou coação por ilegalidade ou abuso de poder”, discutindo-se qual o tipo de violência estaria contido na previsão.

O texto de 1988 foi mais claro: “Conceder-se-á habeas-corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.” Também previu ações de garantia de outros direitos, como o mandado de segurança. Isso, porém, só mudou o debate, sem resolvê-lo.

Em voto recente, o ministro Marco Aurélio Bellizze apontou que essa tendência se consolidou na jurisprudência com a reforma constitucional de 1926. E foi efetivada com o texto de 1934, que criou o mandado de segurança, com processamento similar ao do habeas corpus, para tutelar outros direitos que não as ameaças à liberdade.

Flexibilização
Para o ministro Bellizze, a elasticidade admitida para o HC pela jurisprudência do STJ e do STF desvirtua o sistema. Ele aponta que a Quinta Turma do STJ já admitiu HC até mesmo para ilegalidades quanto a sequestro de bens e ativos financeiros em investigação policial, sem qualquer ameaça, nem mesmo reflexa, ao direito de locomoção do investigado.

O STF, de modo similar, concedeu habeas para garantir direito de visita a preso, porque agravaria o grau de restrição de liberdade do indivíduo. “Parece-me que se foi além da meta”, pondera o relator do HC 216.882.

O ministro aponta, no entanto, que a jurisprudência tem se aplicado de modo mais limitado, com “a tendência de atenuar as hipóteses de cabimento do remédio constitucional, destacando-se que o habeas corpus é antídoto de prescrição restrita, que se presta a reparar constrangimento ilegal evidente, incontroverso, indisfarçável e que, portanto, se mostra de plano comprovável e perceptível ao julgador”.

“Logo, não se destina à correção de equívocos ou situações as quais, ainda que eventualmente existentes, demandam para sua identificação e correção o exame de matéria de fato ou da prova que sustentou o ato ou a decisão impugnada”, afirma o ministro Bellizze.

“Dessa forma, não se presta à correção de decisão sujeita a recurso próprio, previsto no sistema processual penal, não sendo, pois, substituto de recursos ordinário, especial ou extraordinário”, conclui.

Fraude à competência

No texto original da Constituição de 1988, previa-se o cabimento de habeas corpus originário no STF contra decisão de qualquer tribunal, mesmo de segunda instância. Em HC julgado em 1989 (HC 67.263/STF), o ministro do Supremo Moreira Alves afirmava que uma única hipótese impediria essa ação originária, mesmo como substitutivo de outros recursos: se o HC perante o STF fosse em substituição a recurso ordinário em HC (RHC) cabível perante o STJ.

Para o relator, essa restrição evitaria a possibilidade de fraude à competência do STJ e a possibilidade de o interessado escolher a jurisdição que lhe fosse mais conveniente. Segundo o entendimento à época, o réu poderia chegar ao STF, por essa via, apenas em RHC, caso o STJ rejeitasse o pedido de HC ou RHC.

Nesse mesmo voto, porém, o relator apontava que seria cabível o HC originário perante o STF contra apelação, em paralelo ao recurso especial. Nessa situação, caberia ao STJ suspender o julgamento do recurso especial enquanto não julgado o HC pelo Supremo, que poderia inclusive adentrar na revisão de fatos e provas desde que não fosse aprofundada. Já se tinha essa análise como vedada pela via do recurso especial.

Decisão derivada
Em 1999, a Emenda à Constituição 22 alterou a competência do STF para HCs, impedindo seu cabimento contra decisão de qualquer tribunal. Ao apreciar caso já submetido a essa norma, (Questão de ordem no HC 78.897/STF), o ministro Nelson Jobim afirmou que, ao julgar HC substitutivo do RHC cabível contra decisão do segundo grau, o STJ decide de forma derivada. Porém, seu ponto de vista não prevaleceu.

Afirmava o relator, vencido, no Supremo: “A decisão do STJ, no habeas, não foi, a rigor, originária. Foi uma decisão que revisou, via habeas, a decisão do tribunal estadual, contra a qual cabia recurso ordinário. Dessa decisão não cabe recurso ordinário para o STF, porque não é ela originária, mas, sim, derivada.”

“Não cabe recurso ordinário contra decisão do STJ que conhece recurso de decisão de tribunal estadual. Logo, não cabe o habeas corpus, porque ele é substitutivo de recurso ordinário que não cabe. Habeas corpus, substitutivo de recurso ordinário, só tem cabimento quando, contra a decisão inferior, couber recurso ordinário. Não cabendo este, não cabe aquele. O STF não é um terceiro grau de jurisdição”, completava o ministro Jobim.

“Caso contrário – admitido habeas, substitutivo de recurso ordinário, quando não caiba este –, estaríamos admitindo, ao fim e ao cabo, habeas corpus, perante o STF, de decisão tomada por tribunal estadual, confirmada pelo STJ”, arrematava.

Para o ministro Maurício Côrrea, que abriu divergência, exaurida a instância do STJ, seria possível o HC ao STF. Apenas não se poderia deixar à parte a possibilidade de escolher uma jurisdição, na linha do precedente do ministro Moreira Alves de 1989. A emenda constitucional não mudaria essa questão.

Nesse julgamento, o ministro Marco Aurélio Mello, de modo similar, entendia que o STJ, ainda que de modo indireto, cometera o ato questionado ao negar o HC. O ministro Sepúlveda Pertence afirmava que a tradição republicana era de não restringir a competência do Supremo para HC, não excluindo de sua apreciação qualquer negativa da ordem.

“Não quero romper essa tradição. E não creio que a Emenda Constitucional 22, de 1999, o tenha feito; apenas pôs ordem aos degraus da hierarquia judiciária, fazendo com que o tribunal superior competente para conhecer, em recurso especial, das decisões criminais de segundo grau, também se tornasse competente – antes do Supremo, mas sem subtrair-lhe a última palavra – para o julgamento do habeas corpus contra elas requerido. Nada mais do que isso”, ponderava Sepúlveda.

O ministro Sydney Sanches sustentou que o STJ poderia, mesmo em HC originário ou RHC, assim como em recurso especial, incorrer em ilegalidade e cometer ato de constrangimento sanável por HC perante o STF.

Racionalidade constitucional
Desde 2011, pelo menos, o STJ tem tentado dar maior racionalidade ao sistema de habeas corpus. Decisões das duas Turmas especializadas em direito penal do Tribunal vêm limitando o cabimento dos HC substitutivos de RHC.

Para a ministra Maria Thereza de Assis Moura, por exemplo, “o habeas corpus não é panaceia e não pode ser utilizado como um ’super’ recurso, que não tem prazo nem requisitos específicos, devendo se conformar ao propósito para o qual foi historicamente instituído” (HC 239.957).

Na Quinta Turma, precedente do ministro Gilson Dipp também afirma a necessidade de respeito à estrutura recursal constitucional: “Conquanto o uso do HC em substituição aos recursos cabíveis – ou incidentalmente como salvaguarda de possíveis liberdades em perigo –, crescentemente fora de sua inspiração originária, tenha sido muito alargado pelos tribunais, há certos limites a serem respeitados, em homenagem à própria Constituição, devendo a impetração ser compreendida dentro dos limites da racionalidade recursal preexistente e coexistente para que não se perca a razão lógica e sistemática dos recursos ordinários, e mesmo dos excepcionais, por uma irrefletida banalização e vulgarização do HC” (HC 201.483).

A ministra Maria Thereza de Assis Moura decidiu caso em que se ingressou com HC depois de negada, na origem, a admissibilidade do recurso especial. “É mais do que evidente que o habeas corpus não se presta ao papel de substituto de recurso especial, ou do correspondente agravo, tendo, antes, a nobre missão de tutela do sagrado direito de liberdade”, disse ela.

“Ora, o sistema processual penal envolve uma marcha, que é dotada de recursos, que visam ao aprimoramento da prestação jurisdicional. Quando deles se abre mão, tem-se uma consequência jurídica, que é, num primeiro momento, a preclusão e, ao fim e ao cabo do procedimento, o trânsito em julgado”, acrescentou.

“Por mais que, na seara criminal, haja a flexibilização do manto da indiscutibilidade e imutabilidade da sentença condenatória, tal somente ocorre em situações extraordinárias, sob pena de se colocar em xeque relevante pilar axiológico, a segurança jurídica”, continuou a relatora.

“Não está, tout court, ao talante da parte optar entre recurso especial⁄agravo e habeas corpus, ou entre este e a revisão criminal. Não. Passou da hora de se resgatar o prestígio devido ao sistema recursal, inserindo as ações de impugnação no seu devido lugar. Do contrário, a morosidade que tem notabilizado a Justiça criminal não terá fim e o principal prejudicado será aquele que, mais necessitado, clama pela correção de indevida segregação”, concluiu a ministra no HC 138.985.

Burla à Constituição
É nessa direção que a jurisprudência do STF também tem apontado recentemente. “O habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, além de não estar abrangido pela garantia constante do inciso LXVIII do artigo 5º do Diploma Maior, não existindo qualquer previsão legal, enfraquece este último documento, tornando-o desnecessário”, afirmou o ministro Marco Aurélio Mello no HC 109.956/STF.

“O direito é avesso a sobreposições, e impetrar-se novo habeas, embora para julgamento por tribunal diverso, impugnando pronunciamento em idêntica medida implica inviabilizar, em detrimento de outras situações em que requerida, a jurisdição. Cumpre implementar – visando restabelecer a eficácia dessa ação maior, a valia da Carta Federal no que prevê não o habeas substitutivo, mas o recurso ordinário – a correção de rumos”, acrescentou o ministro do Supremo.

“Deve-se afastar o misoneísmo, a aversão a novas ideias”, continuou o relator. “Entre duas possibilidades contempladas na Lei Fundamental, de modo exaustivo, não simplesmente exemplificativo, não há lugar para uma terceira – na espécie, o inexistente, normativamente, habeas corpus substitutivo do recurso ordinário, que, ante a prática admitida até aqui, caiu em desuso, tornando quase letra morta os preceitos constitucionais que o versam”, criticou.

Prescrição cômoda

“É cômodo não interpor o recurso ordinário quando se pode, a qualquer momento e considerado o estágio do processo-crime, buscar-se infirmar decisão há muito proferida, mediante o denominado habeas corpus substitutivo, alcançando-se, com isso, a passagem do tempo, a desaguar, por vezes, na prescrição. A situação não deve continuar, no que já mitigou a importância do habeas corpus e emperrou a máquina judiciária, sendo prejudicados os cidadãos em geral, a cidadania”, completou o ministro Marco Aurélio.

É também a opinião da ministra Rosa Weber: “O habeas corpus tem uma rica história, constituindo garantia fundamental do cidadão. Ação constitucional que é, não pode ser amesquinhado, mas também não é passível de vulgarização, sob pena de restar descaracterizado como remédio heróico.” (HC 104.045/STF).

“Contra a denegação de habeas corpus por tribunal superior prevê a Constituição Federal remédio jurídico expresso, o recurso ordinário. Diante da dicção do artigo 102, II, a, da Constituição da República, a impetração de novo habeas corpus em caráter substitutivo escamoteia o instituto recursal próprio, em manifesta burla ao preceito constitucional”, acrescenta a relatora.

Jurisprudência defensiva
Para o ministro aposentado do STJ Nilson Naves, qualquer restrição ao HC ofende a Constituição. Para ele, conter de qualquer forma esse instrumento ofende não só o texto constitucional, mas princípios de direito que até mesmo a antecedem. Em artigo de 2012, o doutrinador, questionando-se sobre a vocação do STJ no contexto brasileiro, se corte de cassação ou revisão, afirma sobre o HC:

“Qual o desfecho dessa história? O que aconteceu? Ora, especificamente, nem uma coisa nem outra... E o Superior foi criado, já, já Tribunal de mais mil milhares de recursos especiais, de outros tantos e tantos agravos e, mais e mais nessas braçadas e nesse atacado, Tribunal de inúmeras vocações, certamente de vocações outras que não a de encurtar o uso do habeas corpus.”

O ministro Luiz Fux, da Primeira Turma do STF, anota no HC 114.550/STF que não se trata de jurisprudência defensiva, rótulo pejorativo dado a entendimentos que limitam e impedem, com rigor tido por excessivo pelos criticos, a admissibilidade de recursos em certas condições.

“Não é disso que se trata, mas de necessária, imperiosa e urgente reviravolta de entendimento em prol da organicidade do direito”, afirmou Fux. “Essa ação nobre não pode e nem deve ser banalizada a pretexto, em muitos casos, de pseudonulidades processuais com reflexos no direito de ir e vir”, completou.

Para o ministro Bellizze, o direito é dinâmico, de modo que a definição do alcance dos institutos previstos na Constituição Federal deve se adaptar aos valores sociais em mutação. “Tenho ser necessário amoldar a abrangência do habeas corpus a um novo espírito, visando restabelecer a eficácia de remédio constitucional tão caro ao estado democrático de direito”, avalia.
 

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Uniformização da jurisprudência

Trata-se de incidente processual que visa a unificar a jurisprudência de determinado tribunal. Não se presta a unificar a jurisprudência de tribunais distintos.
O incidente de uniformização da jurisprudência não tem natureza recursal - a parte, pois, não tem direito à sua admissão. O requerimento da parte para a formação do incidente de uniformização da jurisprudência não vincula o órgão jurisdicional, que poderá ou não admiti-lo consoante critérios de conveniência e oportunidade.
O pressuposto fundamental para o incidente de uniformização de jurisprudência possa ser admitido e processado é o reconhecimento da divergência na compreensão de determinado assunto pelo tribunal. Suscitado o incidente, o órgão fracionário em que ocorreu a inciativa deve deliberar a respeito da existência ou não de divergência e da conveniência e oportunidade para discussão do tema em grau de uniformização da jurisprudência. Reconhecida a divergência e a conveniência e oportunidade no debate da questão, tem o órgão jurisdicional de suspender o processo para que o tribunal possa se pronunciar pelo seu Plenário ou Órgão Especial a respeito do tema, lavrado o respectivo acórdão. É evidentemente vedada a simultânea admissão do incidente de uniformização de jurisprudência com o prosseguimento do julgamento da causa pelo órgão fracionário que o admitiu. Inadmitido o incidente, tem o órgão fracionário que prosseguir com a discussão e decisão da causa. A decisão que admite ou não incidente de uniformização de jurisprudência é irrecorrível.
 
(Trecho extraído do Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo - 2ª edição - Editora RT - Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero)

Renúncia à herança só pode ser feita por procurador constituído por instrumento público


Por maioria de votos, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, quando a renúncia à herança é feita por procurador, este não pode ser constituído mediante instrumento particular. A outorga da procuração precisa ser feita por instrumento público ou termo judicial.

Acompanhando o voto-vista do ministro Sidnei Beneti, a Turma entendeu que, se o artigo 1.806 do Código Civil (CC) estabelece que a renúncia deve constar expressamente de instrumento público ou termo judicial, então a concessão de poderes para essa renúncia também tem de ser realizada por meio dos mesmos instrumentos.

A questão discutida pelos ministros não foi em relação à possibilidade ou não da renúncia por procurador, a qual é inteiramente válida quando a procuração dá poderes específicos para a renúncia. A Turma discutiu a forma de constituição do procurador para a renúncia, ou seja, a necessidade de instrumento público para a transmissão de poderes.

Cautela

Beneti ressaltou que a exigência de instrumento público, constante no artigo 1.806 do CC, é decorrente do disposto no artigo 108 do mesmo código, que considera a escritura pública essencial à validade dos negócios jurídicos que visem “à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis”.

Segundo o ministro, “a exigência da lei tem toda razão de ser, pois, caso contrário, seria aberto caminho fácil à atividade fraudulenta por intermédio de escritos particulares”. Assim, ele concluiu que o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) violou o artigo 1.806 do CC, ao validar renúncia à herança feita por procurador constituído por instrumento particular.

Por isso, seguindo o voto de Beneti, a maioria dos ministros da Turma deu provimento ao recurso, restabelecendo a sentença de primeiro grau. Ficou vencido o relator, ministro Massami Uyeda, que negava provimento ao recurso e mantinha a decisão do TJSP.
 

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Lei nº 12726, de 16 de outubro de 2012 - Juizado Especial Itinerante

 



Acrescenta parágrafo único ao art. 95 da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, para dispor sobre o Juizado Especial Itinerante.

A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o O art. 95 da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, passa a vigorar acrescido do seguinte parágrafo único:



“Art. 95. ............................................................................

Parágrafo único. No prazo de 6 (seis) meses, contado da publicação desta Lei, serão criados e instalados os Juizados Especiais Itinerantes, que deverão dirimir, prioritariamente, os conflitos existentes nas áreas rurais ou nos locais de menor concentração populacional.” (NR)

Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 16 de outubro de 2012; 191o da Independência e 124o da República.

DILMA ROUSSEFF

José Eduardo Cardozo

Este texto não substitui o publicado no DOU de 17.10.2012
 

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

ECT indenizará advogado que perdeu prazo de recurso por atraso na remessa postal


A responsabilidade do advogado quanto ao cumprimento dos prazos processuais não afasta a dos Correios pelas consequências da prestação de serviço defeituoso. Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu dano moral sofrido por advogado que teve recurso julgado intempestivo (interposto fora do prazo), em consequência de atraso no serviço prestado pelos Correios, condenando a empresa ao pagamento de R$ 20 mil de indenização.

Para o ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso especial, os fatos descritos no processo foram suficientes para causar abalo moral ao profissional. “É natural presumir que eventos dessa natureza sejam capazes de abalar a honra subjetiva (apreço por si próprio) e a objetiva (imagem social cultivada por terceiros) de um advogado, razão suficiente para reconhecer a ocorrência de dano moral indenizável”, afirmou.

Ação indenizatória

O advogado, de Florianópolis, ajuizou ação indenizatória contra a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT), alegando ter sofrido danos morais e materiais em razão do não cumprimento das obrigações contratuais assumidas pela empresa pública.

Segundo o autor, no dia 5 de abril de 2007 (quinta-feira), ele utilizou os serviços de Sedex normal para o envio de petição ao Tribunal Superior do Trabalho, cujo prazo expirava no dia 9 (segunda-feira). Entretanto, a encomenda somente foi entregue ao destinatário no dia 10 (terça-feira), às 18h42, quando já havia terminado o prazo para interposição do recurso.

De acordo com as regras dos Correios para o tipo de serviço contratado, é assegurada entrega de encomendas entre capitais, como Florianópolis e Brasília, até as 18h do dia útil seguinte ao da postagem.

Atraso na entrega

O juízo de primeira instância não reconheceu a ocorrência de dano indenizável, por isso julgou o pedido improcedente. A decisão foi mantida em grau de apelação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4).

De acordo com o tribunal regional, “é do advogado a responsabilidade pela interposição e protocolo de recursos em tempo hábil perante os tribunais superiores; ao escolher dentre os meios disponíveis para tanto – na hipótese, a remessa postal –, assume os riscos decorrentes de possível falha no sistema”.

No recurso especial, o advogado alegou, além dos danos materiais e morais, ofensa a dispositivos do Código Civil, do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e de outras leis que tratam de reparação de danos causados por ato ilícito ou por defeito na prestação dos serviços, obrigação das empresas públicas de prestar serviços eficientes e seguros e responsabilidade da ECT na distribuição e entrega aos destinatários finais.

Prazo legal

Ao analisar o caso, o ministro Luis Felipe Salomão lembrou que é entendimento pacífico no STJ que o prazo para recorrer é cumprido quando a petição chega ao tribunal dentro do prazo legal para a prática do ato, independentemente de ter sido postada nos Correios dentro do prazo recursal.

Ele explicou que a regra aplicada atualmente quanto à responsabilidade civil pela prestação de serviços dessa natureza é o artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição Federal, “que estatui o risco administrativo para o estado e pessoas jurídicas a que faz menção”.

Além disso, ele afirmou que as empresas públicas prestadoras de serviços públicos submetem-se ao regime de responsabilidade civil objetiva, previsto no artigo 14 do CDC: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços.”

Relação de consumo

Para Salomão, há uma relação de consumo entre o advogado e a ECT, a qual foi contratada para remeter a um órgão público as petições do profissional. Nessa hipótese, “a moldura fática delineada pelas instâncias ordinárias revela que o serviço contratado pelo autor não foi prestado exatamente conforme o avençado”, disse.

Apesar disso, afirmou que o advogado é responsável pelo cumprimento dos prazos processuais, não podendo usar eventuais falhas no serviço dos Correios como justificativa para a comprovação de tempestividade.

“Porém, nada do que foi afirmado é capaz de afastar a responsabilidade da empresa fornecedora por um serviço inadequado ou ‘pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços’”, concluiu Salomão.
Exigência legal
Ele mencionou ainda que o consumidor não pode simplesmente absorver a falha da prestação do serviço público como algo tolerável, porque isso ofende a exigência legal segundo a qual “os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias, ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos”.

Salomão entendeu estarem presentes o ilícito contratual cometido pelos Correios, o dano moral suportado pelo autor e o nexo causal entre um e outro. Porém, não acolheu a alegação de danos materiais, visto que o autor não comprovou sua ocorrência e, além disso, o sucesso no processo do qual se originou a demanda não poderia ser garantido.
 

Efeitos dos recursos

O conhecimento do recurso opera efeitos. Constituem efeitos dos recursos os efeitos devolutivo, translativo, suspensivo, expansivo, obstativo e substitutivo. O seu não conhecimento, como regra, impede que o recurso produza qualquer efeito.
 
O efeito devolutivo e o efeito translativo compõem a cognição recursal no plano horizontal - vale dizer, no que tange às questões que podem ser conhecidas pelo tribunal. Pelo efeito devolutivo, será devolvida ao conhecimento do tribunal toda a matéria efetivamente impugnada pela parte em seu recurso (tantum devolutum quantum appelatum). O efeito devolutivo é uma manifestação em seara recursal do valor da autonomia individual, estando ligado, pois, àquilo que a doutrina chama de princípio da demanda ou dispositivo em sentido material. Tudo que o tribunal conhece tão somente em função do efeito devolutivo não pode piorar a situação da parte recorrente. Quanto às questões devolvidas ao tribunal pelo efeito devolutivo, há proibição de reformatio in pejus.
 
Existem matérias que o órgão jurisdicional pode conhecer de ofício e a qualquer tempo no processo (por exemplo, arts. 267, § 3º, e 301, §4º, CPC). Essas matérias, ainda que não alegadas pelas partes em suas razões recursais, podem ser conhecidas em grau recursal. Quando a lei autoriza o conhecimento de ofício e a qualquer tempo no processo de determinados assuntos, essas questões vão automaticamente transladadas para o conhecimento do tribunal à vista da simples admissibilidade do recurso interposto. O efeito translativo é uma manifestação em sede recursal daquilo que a doutrina chama de princípio inquisitório - estando intimamente ligado ao próprio officium iudicis. A propósito das questões conhecidas em face do efeito translativo não incide a proibição da reformatio in pejus - condicionada que está a sua aplicação à proibição de que a própria manifestação de vontade do recorrente acabe por prejudicá-lo.

Uma vez admitido, o recurso tem o condão de inibir a produção de efeitos de determinada decisão (como se dá, em regra, com a sentença) ou de suspendê-los (como pode ocorrer com as decisões interlocutórias e com os acórdãos sujeitos a recurso especial e a recurso extraordinário). O efeito suspensivo do recurso pode ser ex lege - quando a lei desde logo outorga ao recurso o condão de inibir o efeito de determinada decisão (por exemplo, art. 520, CPC) - ou ope iudicis, quando a legislação defere ao órgão jurisdicional a possibilidade de suspender ou não os efeitos da decisão recorrida (por exemplo, arts. 497, 527, III, e 558, CPC). Agregar-se ou não efeito suspensivo à determinada decisão, seja por um juízo do legislador, seja por um juízo jurisdicional, envolve sempre uma solução de compromisso entre dois valores em grande medida antagônicos - o valor da segurança jurídica e o valor da efetividade do processo. Daí a razão pela qual é imprescindível pensar na outorga de efeito suspensivo a determinado recurso sempre na perspectiva do direito fundamental ao processo justo e do  direito fundamental à tutela jurisdicional adequada e efetiva que lhe é inerente, buscando-se o exato equilíbrio entre essas duas exigências para que o processo tenha condições de entender-se como verdadeiro ponto de encontro de direitos fundamentais.

A decisão oriunda do julgamento do recurso pode atingir outras pessoas que não o recorrente e outros atos processuais que não o recorrido. O efeito expansivo subjetivo ocorre quando a decisão do recurso alcança pessoa diversa da pessoa do recorrente (art. 509, CPC). O expansivo objetivo, quando, em face da reforma ou anulação de determinada decisão, outros atos processuais são igualmente atingidos (por exemplo, art. 475-O, II, CPC).

Obstativo. Consoante a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a simples interposição de determinado recurso obsta a formação da preclusão máxima - também chamada pela doutrina de coisa julgada formal. Vale dizer: não é necessário que o recurso seja admitido para que se perpetue a litispendência. Assim já se decidiu que, mesmo no caso de inadmissibilidade ou intempestividade do recurso interposto, ressalvado o erro grosseiro ou a má-fé do recorrente, o trânsito em julgado só se forma com a decisão que inadmite recurso.

Conhecido o recurso, a decisão do órgão recursal substitui a decisão recorrida, obviamente no que essa tiver sido objeto do recurso. (art. 512, CPC)

(Fonte: Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero in Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo - 2ª edição revista, atualizada e ampliada, Editora RT)

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Democracia e probidade administrativa



Um dos pilares conceituais dos regimes democráticos é o princípio conforme o qual o poder é exercido em nome do povo e em benefício da sociedade, daí a definição de um vínculo de confiança entre cidadania e poder. Os detentores de cargos ou funções públicas são mandatários de um poder que não lhes pertence. A democracia é uma fórmula de legitimação do poder, pois o ser humano não compreende a ideia de submeter sua liberdade ou patrimônio ao poder arbitrário de outrem. A controlabilidade dos Poderes é outro fator de legitimação crucial inerente às democracias contemporâneas. As instituições, no contexto da divisão de Poderes, desempenham controles recíprocos. Daí a exigência crescente de transparência dos poderes públicos perante a sociedade. O vínculo de representação não é um cheque em branco aos eleitos, assim como o concurso público não autoriza todo e qualquer ato de um agente político. Pelo contrário, a confiança retirada das urnas ou de concursos públicos, em realidade, renova-se diariamente pelo dever de lealdade institucional a ser observado pelos agentes políticos, que atuam impessoalmente em nome de toda a coletividade.

Nesse contexto é que os atos de improbidade administrativa são interpretados como traição institucional. Não por outra razão, todo o histórico da falta de probidade (desonra no setor público) foi retratado nas Constituições republicanas do Brasil como crime de responsabilidade, desde 1891 até 1988. Para além disso, a improbidade como grave desonestidade funcional ou grave ineficiência endêmica, observados os preceitos tipificatórios da Lei 8.429/92, enseja perda da função pública, suspensão de direitos políticos e interdição de direitos de cidadania, observadas as garantias do Direito Administrativo sancionador.
 
(Fábio Medina Osório - Advogado - Jornal do Comércio 11/10/2012)

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Pessoa jurídica pode responder sem os sócios em ação de improbidade administrativa

Não se exige a presença dos sócios em ação por improbidade administrativa movida contra pessoa jurídica. A decisão é da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e mantém ação contra a S. T. N. S/A.

A empresa responde, ao lado de diversos particulares e agentes públicos, a ação civil pública por supostas vantagens ilícitas obtidas em financiamento do Banco do N.do Brasil (BNB), referente à implantação de rede de transmissão de energia na região.

Dólar na cueca

A ação foi desencadeada com a apreensão de US$ 100 mil nas peças íntimas de um dos envolvidos, que embarcava no avião em São Paulo. Outros R$ 209 mil foram encontrados em sua mala de mão. Para o Ministério Público Federal (MPF), os valores teriam origem nesse empréstimo, que gerou prejuízo significativo ao BNB.

A STN foi obrigada a depositar R$ 6 milhões como garantia do juízo, para o caso de eventual condenação. No Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5), o valor do depósito foi reduzido para R$ 3 milhões. O valor do empréstimo prestado pelo BNB sem registro formal foi de R$ 1,5 milhão.

Legitimidade passiva

No STJ, a empresa questionava aspectos processuais do julgamento no TRF5 e também o fato de constar sozinha, sem os sócios, como ré da ação de improbidade. Para a STN, “o pressuposto básico para o reconhecimento do ato ímprobo é que ele seja praticado com má-fé, sendo impossível se aferir tal conduta de pessoa jurídica”.

O ministro Benedito Gonçalves, porém, entendeu de forma diversa. Para ele, o dever de probidade se estende a todas as pessoas que estejam vinculadas ao poder público, bem como a terceiros que se beneficiem do ato ilícito, inclusive às pessoas jurídicas de direito privado.

Sanções compatíveis

“Tal entendimento não impede que, juntamente com a pessoa jurídica, sejam incluídos no polo passivo os sócios e gestores, os quais responderão com o seu patrimônio pessoal, apenas não configurando tal conduta uma obrigatoriedade”, esclareceu o relator.

Ele também anotou que algumas condenações previstas na Lei de Improbidade Administrativa são incompatíveis com as pessoas jurídicas, como a perda de cargo, mas isso não inviabiliza a aplicação de outras sanções.

Processo: REsp 970393

Fonte: Superior Tribunal de Justiça
 

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Anulação de atos praticados por advogado suspenso do exercício profissional não é automática

 
É relativa a nulidade decorrente de atos praticados por advogado cujo exercício profissional foi suspenso pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), tornando-se obrigatória a demonstração de efetivo prejuízo causado à defesa. Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) não acolheu o pedido de um casal para que o julgamento de apelação fosse considerado nulo devido à suspensão da inscrição do advogado subscritor na OAB.

O casal ajuizou ação rescisória contra outro casal, ao argumento de que a apelação interposta em demanda transitada em julgado fora subscrita por advogado suspenso do exercício de suas atividades profissionais, razão pela qual deveria ser considerada nula, sem possibilidade de convalidação.

O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) julgou o pedido improcedente, por considerar que o artigo 10 da Lei 8.906/94 faculta ao advogado inscrito em outra seção atuar em cinco causas por ano em seccional diversa. “Se estava o advogado suspenso de sua inscrição junto à OAB/RS, na OAB/SP nunca houve impedimento ou suspensão, além de não estar excluído dos quadros da entidade”, afirmou o TJRS.

Vício e prejuízo

No STJ, o casal sustentou que o recurso de apelação interposto pelo advogado consubstancia nulidade absoluta, circunstância que impediria seu conhecimento no processo original.

Em seu voto, o ministro Luis Felipe Salomão, relator, destacou que a decretação de nulidade só é factível quando não se puder aproveitar o ato processual em virtude da efetiva ocorrência e demonstração de prejuízo, uma vez que a invalidade processual é sanção aplicável apenas quando conjugados o vício do ato processual e a existência de prejuízo.

“No caso, o ato diz respeito à capacidade postulatória, a qual é atributo do advogado legalmente habilitado e regularmente inscrito na OAB, cuja finalidade é garantir a defesa dos direitos da parte patrocinada, conferindo-lhe capacidade de pedir e de responder em juízo, desiderato que foi efetivamente alcançado, ainda que o causídico fosse suspenso à época, tanto que a demanda indenizatória foi julgada procedente e a decisão transitou em julgado”, afirmou o ministro.
 

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Sistema de acompanhamento da execução das penas - Lei nº 12714, de 14 de setembro de 2012


LEI Nº 12.714, DE 14 DE SETEMBRO DE 2012.

 
Dispõe sobre o sistema de acompanhamento da execução
 das penas, da prisão cautelar e
 da medida de segurança.

 
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o Os dados e as informações da execução da pena, da prisão cautelar e da medida de segurança deverão ser mantidos e atualizados em sistema informatizado de acompanhamento da execução da pena.
§ 1o Os sistemas informatizados de que trata o caput serão, preferencialmente, de tipo aberto.
§ 2o Considera-se sistema ou programa aberto aquele cuja licença de uso não restrinja sob nenhum aspecto a sua cessão, distribuição, utilização ou modificação, assegurando ao usuário o acesso irrestrito e sem custos adicionais ao seu código fonte e documentação associada, permitindo a sua modificação parcial ou total, garantindo-se os direitos autorais do programador.
§ 3o Os dados e as informações previstos no caput serão acompanhados pelo magistrado, pelo representante do Ministério Público e pelo defensor e estarão disponíveis à pessoa presa ou custodiada.
§ 4o O sistema de que trata o caput deverá permitir o cadastramento do defensor, dos representantes dos conselhos penitenciários estaduais e do Distrito Federal e dos conselhos da comunidade para acesso aos dados e informações.
Art. 2o O sistema previsto no art. 1o deverá conter o registro dos seguintes dados e informações:
I - nome, filiação, data de nascimento e sexo;
II - data da prisão ou da internação;
III - comunicação da prisão à família e ao defensor;
IV - tipo penal e pena em abstrato;
V - tempo de condenação ou da medida aplicada;
VI - dias de trabalho ou estudo;
VII - dias remidos;
VIII - atestado de comportamento carcerário expedido pelo diretor do estabelecimento prisional;
IX - faltas graves;
X - exame de cessação de periculosidade, no caso de medida de segurança; e
XI - utilização de equipamento de monitoração eletrônica pelo condenado.
Art. 3o O lançamento dos dados ou das informações de que trata o art. 2o ficará sob a responsabilidade:
I - da autoridade policial, por ocasião da prisão, quanto ao disposto nos incisos I a IV do caput do art. 2o;
II - do magistrado que proferir a decisão ou acórdão, quanto ao disposto nos incisos V, VII e XI do caput do art. 2o;
III - do diretor do estabelecimento prisional, quanto ao disposto nos incisos VI, VIII e IX do caput do art. 2o; e
IV - do diretor da unidade de internação, quanto ao disposto no inciso X do caput do art. 2o.
Parágrafo único. Os dados e informações previstos no inciso II do caput do art. 2o poderão, a qualquer momento, ser revistos pelo magistrado.
Art. 4o O sistema referido no art. 1o deverá conter ferramentas que:
I - informem as datas estipuladas para:
a) conclusão do inquérito;
b) oferecimento da denúncia;
c) obtenção da progressão de regime;
d) concessão do livramento condicional;
e) realização do exame de cessação de periculosidade; e
f) enquadramento nas hipóteses de indulto ou de comutação de pena;
II - calculem a remição da pena; e
III - identifiquem a existência de outros processos em que tenha sido determinada a prisão do réu ou acusado.
§ 1o O sistema deverá ser programado para informar tempestiva e automaticamente, por aviso eletrônico, as datas mencionadas no inciso I do caput:
I - ao magistrado responsável pela investigação criminal, processo penal ou execução da pena ou cumprimento da medida de segurança;
II - ao Ministério Público; e
III - ao defensor.
§ 2o Recebido o aviso previsto no § 1o, o magistrado verificará o cumprimento das condições legalmente previstas para soltura ou concessão de outros benefícios à pessoa presa ou custodiada e dará vista ao Ministério Público.
Art. 5o O Poder Executivo federal instituirá sistema nacional, visando à interoperabilidade das bases de dados e informações dos sistemas informatizados instituídos pelos Estados e pelo Distrito Federal.
Parágrafo único. A União poderá apoiar os Estados e o Distrito Federal no desenvolvimento, implementação e adequação de sistemas próprios que permitam interoperabilidade com o sistema nacional de que trata o caput.
Art. 6o Esta Lei entra em vigor após decorridos 365 (trezentos e sessenta e cinco) dias de sua publicação oficial.
Brasília, 14 de setembro de 2012; 191o da Independência e 124o da República.

DILMA ROUSSEFF
José Eduardo Cardozo
Maria do Rosário Nunes

Este texto não substitui o publicado no DOU de 17.9.2012

(www.planalto.gov.br )

Prescrição das ações por abandono afetivo conta da maioridade do interessado

O prazo prescricional das ações de indenização por abandono afetivo começa a fluir quando o interessado atinge a maioridade e se extingue, assim, o pátrio poder. Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a ocorrência de prescrição em ação proposta por filho de 51 anos de idade.

No caso, o filho buscava compensação por danos morais decorrentes de abandono afetivo e humilhações que teriam ocorrido quando ainda era menor de idade. Sustentou que sempre buscou o afeto e reconhecimento de seu genitor, “que se trata de um pai que, covardemente, durante todos esses anos, negligenciou a educação, profissionalização e desenvolvimento pessoal, emocional, social e cultural de seu filho”. Afirmou também, que, desde o nascimento, ele sabia ser seu pai, todavia, somente após 50 anos reconheceu a paternidade.

O juízo da 5ª Vara Cível do Foro Regional da Barra da Tijuca (RJ), em decisão interlocutória, rejeitou a arguição de prescrição suscitada pelo pai. Inconformada, a defesa do genitor recorreu ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que reconheceu a prescrição e julgou extinto o processo com resolução de mérito.

Reconhecimento tardio

No STJ, o autor da ação argumentou que o genitor tem outros dois filhos aos quais dedicou cuidados integrais, “não só no sentido emocional, mas também financeiramente”, proporcionando-lhes “formação de excelência”.

Sustentou ainda que, enquanto conviveu com o pai, sofreu desprezo, discriminação e humilhações repetidas, o que lhe teria causado dor psíquica e prejuízo à formação da personalidade, decorrentes da falta de afeto, cuidado e proteção. Alegou também que só houve o reconhecimento da paternidade em 2007, por isso não se poderia falar em decurso do prazo prescricional.

Em seu voto, o relator, ministro Luis Felipe Salomão, destacou que a ação de investigação de paternidade é imprescritível, tratando-se de direito personalíssimo, e a sentença que reconhece o vínculo tem caráter declaratório, visando acertar a relação jurídica da paternidade do filho, sem constituir para o autor nenhum direito novo, não podendo o seu efeito retroativo alcançar os efeitos passados das situações de direito.

Maioridade aos 21

Segundo Salomão, o artigo 392, III, do Código Civil de 1916 dispunha que o pátrio poder extinguia-se com a maioridade do filho, que, na vigência daquele código, ocorria aos 21 anos completos. “Nessa linha, como o autor nasceu no ano de 1957, fica nítido que o prazo prescricional fluiu a contar do ano de 1978, ainda na vigência do Código Civil de 1916, sendo inequívoco que o pleito exordial cuida de direito subjetivo, dentro do que o código revogado estabelecia como direito pessoal”, afirmou.

O relator ressaltou ainda que não é possível a invocação de prazo prescricional previsto no Código Civil em vigor. Isso porque, como o artigo 177 do CC/16 estabelecia que as ações pessoais prescreviam, ordinariamente, em 20 anos, e como o filho ajuizou a ação buscando compensação por alegados danos morais apenas em outubro de 2008, quando contava 51 anos de idade, fica nítido que operou a prescrição, ainda na vigência do código de 1916.

O número deste processo não é divulgado em razão de sigilo judicial.
 

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Pré-penhora e sua conversão em penhora.

Não sendo encontrado o executado em seu domicílio, o oficial de justiça deverá arrestar-lhe tantos bens quantos bastem para garantia da execução. Trata-se de pré-penhora. Dois são os pressupostos para sua realização: a ausência do executado em seu domicílio e a existência visível de bens penhoráveis. O art. 653, CPC, não se aplica faltando qualquer um de seus dois pressupostos. (STJ, 3ª Turma, Ag 438.015/DF, rel. Min. Ari Pargendler, j. em 27.05.2003, DJ 10.06.2003).
 
Depois de realizada a pré-penhora, o oficial procurará o executado por mais três vezes em dias distintos para citá-lo e cientificá-lo da pré-penhora. Persistindo o desencontro,  cumpre ao oficial certificar o ocorrido.
 
Não encontrado o executado, cumpre ao exequente requerer, dentro do prazo de 10 (dez) dias, contados a partir do primeiro dia útil subsequente à data em que foi intimado da pré-penhora (arts. 184, § 2º, e 654, CPC), a citação do executado por edital. A ausência de requerimento do exequente para citação do executado por edital importa desfazimento da pré-penhora e extinção da execução.
 
Findo o prazo do edital (arts. 232 e241, V, CPC), converte-se a pré-penhora automaticamente em penhora, caso não tenha o executado comparecido ou, comparecendo, não tenha efetuado o pagamento no prazo de 3 (três) dias (art. 652, CPC). A conversão independe de requerimento da parte ou de qualquer manifestação do juiz nesse sentido.
 
É desnecessária a intimação do executado da conversão da pré-penhora em penhora. Observe-se que a jurisprudência exigia a intimação da conversão da pré-penhora em penhora porque daí fluía o prazo para o executado propor, querendo, embargos do executado. A razão estava em que a penhora constituía anteriormente pressuposto para propositura de embargos do executado. Como atualmente o prazo para os embargos do executado flui da juntada do mandado de citação do executado aos autos (art. 738, CPC) ou, na hipótese de citação por edital, da data em que finda a dilação assinada pelo juiz (art. 241, V, CPC) independentemente de penhora (art. 736, CPC),  é desnecessária a intimação do executado da conversão da pré-penhora em penhora.
 
(Trecho extraído do Código de Processo Civil comentado artigo por artigo - 2ª edição revista, atualizada e ampliada- Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero - Editora RT)

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Nova súmula impede prestação de serviço como condição para regime aberto

 
A Súmula 493 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) vedou a aplicação das penas substitutivas previstas no artigo 44 do Código Penal (CP) como condição para a concessão de regime aberto ao preso. “É inadmissível a fixação de pena substitutiva (artigo 44 do CP) como condição especial ao regime aberto”, diz a súmula aprovada pela Terceira Seção do STJ.

A jurisprudência foi delineada pela Terceira Seção no julgamento do Recurso Especial (REsp) 1.107.314, que seguiu a sistemática dos recursos repetitivos, nos moldes do artigo 543-C do Código de Processo Civil. A Seção entendeu não haver norma legal disciplinando o que são “condições especiais”, já que o artigo 115 da Lei de Execução Penal (LEP) deixou a cargo do magistrado estabelecê-las. Entretanto, a maioria do órgão julgador votou no sentido de que essas não podem se confundir com as penas restritivas de direito previstas no artigo 44 do CP.

O artigo 115 da LEP diz que “o juiz poderá estabelecer condições especiais para a concessão de regime aberto”, sem prejuízo de algumas condições gerais e obrigatórias trazidas pela própria lei, como não sair da cidade sem autorização judicial e voltar para casa nos horários determinados.

Alguns tribunais de Justiça editaram normas complementares ao artigo 115 da LEP, prevendo entre elas a prestação de serviços à comunidade. Porém, a Seção destacou que legislar sobre direito penal e processual é competência privativa da União, prevista no artigo 22 da Constituição Federal, portanto as cortes estaduais devem “se abster de editar normativas com esse conteúdo”.

O ministro Napoleão Nunes Maia Filho, que relatou o recurso, apontou que as condições não podem se confundir com as punições previstas na legislação penal, como o caso dos serviços comunitários. Segundo ele, é lícito ao juiz estabelecer condições especiais para o regime aberto, complementando o artigo 115 da LEP, “mas não poderá adotar a esse título nenhum efeito já classificado como pena substitutiva (artigo 44 do CP), porque aí ocorreria o indesejável bis in idem, importando na aplicação de dúplice sanção”.

Constrangimento
Em outro precedente da súmula, o Habeas Corpus (HC) 228.668, o ministro Gilson Dipp apontou que a Quinta Turma do STJ vinha entendendo que a prestação de serviços à comunidade ou a prestação pecuniária podiam ser adotadas como condição especial. Porém, o recurso repetitivo firmou a jurisprudência de que isso não é possível. O ministro determinou que outra condição especial, além dos serviços, devia ser imposta.

Já no HC 125.410, relatado pelo ministro Jorge Mussi, o condenado teve sua pena de reclusão convertida em prestação de serviços à comunidade. Ele não cumpriu a sanção e a pena foi convertida em privativa de liberdade, sem a condição especial. Posteriormente o Ministério Público recorreu e o Tribunal de Justiça de São Paulo o atendeu, impondo a prestação dos serviços como condição para o cumprimento da pena em regime aberto.

A defesa alegou que isso seria utilizar duas penas autônomas como sanção e que os serviços comunitários não são cumuláveis com pena privativa de liberdade. O ministro Mussi concluiu que houve constrangimento ilegal no caso. (www.stj.gov.br )