Entender, pensar e aplicar o direito processual civil na perspectiva neoconcretista é compreender processo como método de atuação do Estado-juiz para prestar tutela jurisdicional a quem, no plano material, faz jus a ela. Direito que é reconhecido suficiente pelo próprio Estado-juiz ou, até mesmo, por ato estranho e anterior ao processo, pouco importa, mas o direito aplicável ao caso concreto. É entender que tão importante quanto o reconhecimento do direito aplicável ao caso é torná-lo realidade, mesmo contra ou a despeito da vontade de seu destinatário. É, portanto, concretizá-lo. Trata-se de eleger, sempre conscientemente, que a tutela jurisdicional é o polo metodológico do direito processual civil na atualidade. Que os demais institutos chamados de "fundamentais" - jurisdição, ação, processo e defesa - o são mais em perspectiva histórica do que atual. Eles são fundamentais para o amadurecimento e o desenvolvimento do direito processual civil tal qual ele merece ser entendido nos dias de hoje, inclusive no e por causa do modelo constitucional. Mas é possível, e desejável, alterar o foco.
Ser neoconcretista é saber discernir os planos do direito processual civil (o "plano processual") e do direito material ( o "plano material") dentro das suas peculiaridades evidentes; não, contudo, de isolar o direito processual civil e contrapô-lo ao direito material. É, portanto, entender o direito processual civil como instrumento do direito material; como meio e não como fim. Meio de prestar tutela jurisdicional a que tem, na perspectiva do direito material, direito devida e suficientemente reconhecido. Prestar tutela jurisdicional sempre na compreensão de que tanto quanto saber quem tem o direito (na perspectiva ideal) é satisfazer, efetivando, concretizando este mesmo direito (na perspectiva prática). É transformar em "ser" o que, na perspectiva do reconhecimento do direito, é "dever-ser".
Todo cuidado é pouco com o entusiasmo que estas palavras podem causar. Embora o neoconcretismo coloque, conscientemente, a tutela jurisdicional como centro das atenções do direito processual civil ou, como prefiro, eleja-a como elo metodológico fundamental do direito processual civil da atualidade, isto não autoriza - e nem quer autorizar - que o neoconcretista preocupe-se mais com a efetivação do direito do que com seu reconhecimento. Não há espaço, no modelo constitucional do direito processual civil, para compreender que o fim (a prestação da tutela jurisdicional) justifica os meios. Não, definitivamente não. E a explicação vem do próprio modelo de Estado, o Estado Constitucional, criado pela CF de 1988.
Assim, até para evitar erros do passado (sempre, insisto, tão fáceis de serem detectados na perspectiva do presente) todo o exagero é vedado. Prestar tutela jurisdicional, concretizando o direito sim, mas sempre, invariavelmente, de acordo com o devido processo constitucional, expressão suficientemente eloquente que sintetiza o que, na perspectiva da atuação do Estado-juiz para reconhecer e para satisfazer o direito é absolutamente indispensável.
(Cassio Scarpinella Bueno - Manual de Direito Processual Civil - 2ª edição - 2ª tiragem - 2016)
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